Conto: Sementes da esperança (Parte 2)

No dia seguinte Mbongo subiu a montanha. Quando chegou ao alto já estava entardecendo. O pico da montanha estava coberto de neve e o vento era frio, apesar disto Mbongo não se importou muito. Decidiu permanecer ali. Elevou bem os braços, da maneira como havia recebido as orientações do guardião da montanha, e ficou observando o céu, na expectativa de ver passar uma estrela cadente. Ficou assim por um bom tempo até perceber que uma estrela se aproximava. Mbongo ficou muito contente! Com os braços bem erguidos esperava conseguir segurar aquela estrela e pedir para ela as sementes da esperança, mas a estrela passou bem longe. Mbongo não desanimou, continuou firme. Naquela noite passaram muitas estrelas cadentes, uma após a outra; entretanto elas cruzavam o céu distantes de Mbongo ou passavam de tal maneira que ele não conseguia segurá-las. Em certo momento deu a impressão que uma estrela estava chegando perto. Mbongo então pensou: “Agora vou conseguir!” Estendeu bem os seus braços e tentou agarrá-la. A luz, porém, era muito intensa e por isto Mbongo não conseguiu manter os braços erguidos, cobriu com as mãos os olhos para se proteger da intensa luminosidade e a estrela passou logo acima da sua cabeça. Assim transcorreu a noite inteira e por mais que Mbongo tentasse, não conseguia o que desejava. Desceu a montanha triste e cabisbaixo. No caminho de volta reencontrou, o guardião da montanha. Não foi preciso dizer que não havia conseguido nada. O ancião olhou para ele, balançou a cabeça e disse: “Pena! Creio que você precisa de ajuda, sozinho não vai conseguir!”.
Mbongo desceu até a aldeia e as crianças vieram ao seu encontro perguntando “Chefe Mbongo, chefe Mbongo, você conseguiu pegar uma estrela?’’. Mbongo sacudiu a cabeça e disse: “Daqui a alguns dias voltarei ao pico da montanha para agarrar uma estrela cadente, mas preciso de ajuda, quem quer vir comigo?”. Mais uma vez houve algumas pessoas que simplesmente riram dele, outras sacudiram a cabeça em negação. Mbongo não desanimou, insistiu muito e depois de conversar com vários, conseguiu que um dos seus melhores amigos, Tobo, aceitasse fazer a caminhada com ele até o alto da montanha.
Passado alguns dias, Mbongo retornou à montanha, desta vez acompanhado de seu amigo Tobo. Ao chegar ao cume, os dois amigos, com os braços erguidos, tentaram pegar alguma estrela, mas, como da primeira vez, não tiveram sucesso. Houve algumas estrelas que passaram próximas, mas sua luz era tão intensa que ofuscava a Mbongo e a Tobo de tal maneira que não conseguiram segurá-las. No caminho de volta, descendo a montanha, encontraram o ancião que vendo-os balançou a cabeça e disse: “Vocês precisam de mais ajuda; convençam a quantos puderem a subir com vocês. As estrelas têm muita luz, por isto precisam da cooperação de mais pessoas!”.
Mbongo e Tobo desceram e começaram a conversar com as famílias da aldeia. Havia aqueles que não acreditavam e achavam que nada daria certo. O problema da falta de chuvas aumentava, cada vez havia menos água, o riachinho diminuía seu caudal e, em breve, eles não mais conseguiriam plantar seus alimentos. Depois de muita conversa e esforço, Mbongo conseguiu que algumas pessoas subissem com ele. Era um grupo não muito numeroso, escalaram o cume e ficaram esperando que as estrelas passassem. Ergueram seus braços, cada um em uma direção e, meio dispersos, tentaram pegar as estrelas mas nada conseguiram.
Ao descer, o grupo cabisbaixo, encontrou mais uma vez o guardião da montanha que olhou para eles e perguntou como haviam feito. Eles lhe contaram. Então disse: “Sim, foi bom que vocês vieram em maior número, mas precisam trabalhar juntos. Deixem chefe Mbongo erguer os braços, os demais devem colocar suas mãos sobre os ombros dele. Formem vários círculos a sua volta. Todos devem apoiar suas mãos uns sobre os ombros dos outros de modo que Mbongo sinta toda a força do grupo direcionada para ele. Assim ele poderá segurar a estrela, poderá aguentar seu imenso brilho!” Estavam reiniciando a descida, quando o ancião ainda lhes disse: “Na verdade, creio que o grupo de vocês ainda não é forte o suficiente, tentem convencer todos, toda a aldeia! Pois as sementes da esperança servirão para todos e não apenas para um grupo, convençam a todos que devem subir a montanha, homens, mulheres, velhos, jovens, crianças, todos!”.
Mbongo e o grupo desceram animados pelas palavras do guardião da montanha. Conversaram com as pessoas, explicaram que era necessária a ajuda de todos. Era importante mostrar às pessoas que seria possível agarrar uma estrela, se eles acreditassem nisto. Havia muitos que relutavam, entre os mais velhos, alguns ficavam em dúvida “Será que conseguiremos subir essa montanha tão alta?”. As crianças, porém, eram as mais animadas: “Nós queremos subir, vamos todos com chefe Mbongo!”. Lamentavelmente o grupo que havia subido a montanha não conseguiu convencer a todos. Passaram-se várias semanas. Contudo a falta de água, por fim, colaborou para que as pessoas aceitassem aquela ideia. Havia bem pouca água para beber, escasseavam os alimentos, as famílias estavam consumindo suas últimas reservas. Em pouco tempo começariam a passar fome. Tudo isso junto, fez com que as pessoas ouvissem as palavras de estímulo de chefe Mbongo e, por fim, toda a aldeia decidiu subir a montanha. Foi uma longa caminhada, principalmente para os pezinhos pequenos e para os mais velhos. Chefe Mbongo ia a frente, toda a aldeia o seguia, dando o apoio necessário uns aos outros. Foi uma caminhada longa, árdua e difícil! Depois de grande esforço, chegaram ao cume. Fizeram como o guardião havia orientado: Chefe Mbongo no centro, os que estavam mais próximos apoiavam suas mãos sobre os seus ombros. Os outros iam formando círculos ao redor, cada vez círculos maiores. Todos apoiavam suas mãos uns sobre os ombros dos outros, todos concentrados na vontade única: “vamos unir nossas forças para que chefe Mbongo possa pegar a estrela!” Assim ficaram um longo período; as estrelas começavam a passar, primeiro distante, mas pouco a pouco iam chegando mais perto, até que uma linda e brilhante estrela – talvez a mais brilhante que chefe Mbongo havia visto – começou a se aproximar. Chefe Mbongo ergueu bem as mãos e todos, unindo forças, desejavam que desta vez desse certo. Para a alegria geral, a estrela se aproximou cada vez mais. Quando estava bem próxima, chefe Mbongo teve a sensação que já podia tocar a luz, que desta vez não lhe ofuscou a vista! Então ele gritou: “Bela estrela, dê-nos suas sementes da esperança!”. Nesse instante, da linda estrela brilhante, começaram a cair milhares de sementinhas brilhantes. Chefe Mbongo disse a todos: “Ergam as mãos! Recolham as sementes, recolham o quanto vocês puderem!”. Todos ergueram as mãos para recolher as sementes da esperança que caiam como chuva sobre eles. Depois que havia caído uma quantidade enorme de sementes da esperança, a estrela prosseguiu no céu seu caminho. Todos estavam muito contentes!
As pessoas tinham as mãos repletas de sementes da esperança. Também os cabelos, as barbas – de quem as tinham – as pregas das roupas, tudo estava coberto de sementes da esperança. E assim começaram sua caminhada de volta à aldeia. Ao chegarem naquela plataforma de pedra, encontraram o guardião que, desta vez, sorriu e lhes disse: “Saibam usar bem as sementes da esperança! Prestem atenção, pois quando chegarem lá em baixo terão uma surpresa! Não desanimem! Saibam que o que vocês fizeram só foi possível porque a força de todos se uniu em torno de um objetivo comum.” As pessoas estavam felizes carregando suas sementes. Quando chegaram ao vale, porém, já era dia claro e as sementes brilhantes que haviam recolhido em suas mãos, nas pregas de suas roupas, nos seus cabelos e na barba haviam desaparecido! Começaram a murmurar tristes e desanimados: “Foi inútil todo nosso esforço? O que aconteceu com as sementes? Para onde foram?”
Chefe Mbongo refletiu um instante sobre as palavras do guardião da montanha e falou ao povo: “Meus irmãos, as sementes não desapareceram, elas estão dentro de nós. Dentro de nossas cabeças, em nossos pensamentos! Em nossas mãos e em nossas pernas, na nossa força de trabalho! Em nosso coração e em nossa alma, aí se encontram as sementes da esperança!”.
-Mas o que isto significa? O que muda em nossas vidas? – perguntaram alguns.
Mbongo olhou em volta e disse:
– Vocês não percebem? Olhem as crianças, como estão felizes! Estão cheias de esperança dentro de si! Olhem como brincam alegres! Olhemos uns nos olhos dos outros! Vejam como nosso olhar está diferente! Tudo isso significa que as sementes da esperança estão dentro de nós, mas para que elas cresçam e produzam seus frutos não podemos desanimar!
– Mas o que podemos fazer então? Não choveu ainda, não aconteceu nada!
– Primeiro vamos fazer nossas tarefas: plantar nossas hortas, plantar os grãos que ainda temos de reserva na esperança de que virá chuva, na esperança de que nosso trabalho não será em vão! Vamos fazer nossas tarefas de todos os dias. Às noites, vamos celebrar com alegria nossas festas, vamos cantar, rezar, confraternizar e tudo vai dar certo!
Mbongo estava pleno das sementes da esperança e tinha certeza de que tudo aconteceria daquele modo. Alguns ainda tiveram dúvidas, mas decidiram fazer como Mbongo havia dito. Nos dias que se seguiram as famílias foram para as suas hortas, plantaram e cuidaram das suas tarefas. Quando chegava à noite faziam festas, cantavam e se alegravam. Assim passaram alguns dias. Não tardou muito e a desejada chuva chegou. Encheu de novo o riachinho, os animais voltaram às florestas, as plantas começaram a germinar nas hortas e nos campos os grãos brotavam. A vida pôde continuar naquele vale!
Chefe Mbongo nunca mais subiu a montanha, não foi necessário. Ele havia recolhido tantas sementes da esperança em si que lhe bastaram. Ele abrigou em si esperança e força para o futuro durante todos os dias da sua vida. Chefe Mbongo, entretanto, sempre que havia oportunidade, reunia os mais jovens para contar-lhes aquela experiência: Na vida às vezes é necessário reunir o esforço de todos para alcançar o bem comum. Deste modo, cada um pode receber, em si, as sementes da esperança! Esta lição vale a pena levar para o futuro!

Renato Gomes