Reflexão para o domingo, 19 de dezembro

Época de Advento

Referente ao perícope de Mateus 25, 1-13

O óleo é uma substância formada numa planta no final de um ciclo de vida, ou seja, no fruto, na semente. Esta substância é formada no limiar entre vida e morte, mas contém em si luz e calor, elementos intrínsecos para o desenvolvimento da vida. Nós consagramos o óleo, o azeite de oliva, para usá-lo na extrema unção, quando a alma se aproxima do limiar da morte. No sacramento da extrema unção se consagra a alma para o espírito, para que passe de uma existência e vida terrena para uma existência e vida divino-espiritual, através da força de Cristo, que pela ressurreição venceu as forças da morte. A ligação da alma com o Cristo conduz hoje a esta passagem, como também a substância do óleo com sua luz e calor promove a vida que se desenvolve quando a semente cai na terra, morre e germina.
Muitos são os que apontam para o fato de que a humanidade está hoje se aproximando de um limiar, sobretudo no plano de sua consciência. O limiar entre uma consciência dirigida, por um lado, para o mundo material exterior, como descrito pelas ciências naturais, e uma consciência, por outro lado, inserida num mundo real em desenvolvimento com seres da natureza e também seres divinos espirituais. O limiar entre uma cegueira diante do mundo espiritual para uma nova clarividência espiritual. Neste limiar se vivencia a presença do Cristo no etérico. Da passagem por este limiar vai depender todo o futuro da humanidade, da Terra e de cada alma individual. Como em todo limiar se torna necessário deixar algo para trás e se ligar a um novo impulso de desenvolvimento, de vida. O momento da passagem é um momento crítico, incerto, pois ainda não se alcançou o novo plano de vida. O momento da passagem acontece num plano oculto, dentro da alma humana, à noite, como na parábola das 10 virgens. A hora da passagem não é conhecida, pois a nossa consciência não abarca os mistérios da vida, da evolução. Só um ser conhece o mistério do tempo, o mistério da evolução, o ser que diz: “Eu sou o Alfa e o Ômega, o princípio e a meta universal. Eu sou o que foi, o que é e o que há de vir.” Este é o ser que diz também: “Eu sou o caminho, a verdade e a vida.” Para realizar a passagem, seja para a vida pós-morte, seja para uma nova existência em e com Cristo, a alma deve se colocar a caminho e estar com os sentidos alertas para perceber o sinal vindo do mundo espiritual. Ela deve levar a substância que superou o peso terreno, que amadureceu na vida terrena e se transformou em luz espiritual, a luz interior que não se apaga, a luz do Eu Sou, dos Filhos da Luz. Esta luz será vista e reconhecida pelo Cristo. Quem não for um portador do Eu Sou, um portador de luz, um Cristóforo, não será reconhecido pelo Cristo.
Leonardo da Vinci, na sua representação do ser humano como uma estrela de cinco pontas, sendo a cabeça a ponta de cima, os dois braços esticados as pontas do lado e os dois pés as pontas de baixo, percebeu a correlação do número 5 com a existência humana terrena. Também na parábola, o número 5 indica o que deve ser o desenvolvimento da alma humana, que na sua imagem arquetípica é virgem, pura, espiritual. Mas a alma vive em dois âmbitos distintos, o âmbito da Terra e o âmbito anímico espiritual, o âmbito do sono e o da vigília, o âmbito do cotidiano e da vida exterior e o âmbito da vida interior. Este âmbito da vida interior vai se tornar cada vez mais importante para o futuro da humanidade.
O drama da alma humana é hoje bem representado pela parábola das 2×5=10 virgens, cinco com as lâmpadas sem óleo suficiente, que no momento decisivo só pode ser comprado, as outras cinco com as lâmpadas acesas, as lâmpadas das prudentes, que tem uma vida interior intensa. As cinco que compraram o óleo vão ficar do lado de fora e as portas do limiar não lhe serão abertas. A antiga corporalidade, a antiga veste da alma humana passará, mas uma nova veste de luz lhe será conferida.
“Céu e Terra vão passar, mas minhas palavras não passarão.” As cinco portadoras do Eu Sou de Cristo, portadoras das Suas palavras, da Sua luz, entrarão no Seu âmbito de vida. Nelas estão vivas as palavras de Cristo: “Eu Sou a luz do mundo, quem me segue não andará em trevas de nenhuma maneira, mas terá a luz da vida.”
No momento atual estamos caminhando nas trevas e talvez mais preocupados em ir comprar o que nos falta, adquirir o que nos falta, sem perceber que o Cristo está bem próximo e que só Nele encontraremos o manancial da vida, da saúde. Superemos nossa cegueira espiritual, que só procura soluções no exterior para os problemas atuais e acendamos a luz da fé e da verdade em nossos corações! Cristo é a única realidade verdadeira em que vivemos!

Helena Otterspeer

Reflexão para o domingo, 12 de dezembro

Época de Advento

Referente ao perícope de Lucas 1, 39-56

Ao vermos o brotar da água em uma nascente, vivenciamos o surgimento de um rio. Em alguns casos ele se encontra, no seu caminho, com outro rio. Assim eles unem suas forças e levam grande energia vital ao mundo.

No Evangelho de hoje lemos o primeiro encontro entre João e Jesus na Terra, ainda no ventre de suas mães. Eles unem suas forças para o desenvolvimento da humanidade e levam ao mundo a corrente da água da vida.

Como nos unimos a esta corrente?

Através de orações, de momentos de contemplação e ações para o próximo, somamos água ao grande rio espiritual. Depende de nós, seres humanos, que esse rio receba cada vez mais forças e leve sempre mais água da vida para o mundo.

Julian Rögge

Reflexão para o domingo, 5 de dezembro

Época de Advento

Referente ao perícope de Lucas 10, 26-38

Neste segundo domingo de Advento, Maria é o foco central. A ela é feita a anunciação da chegada do filho de Deus para salvação da humanidade. Podemos dizer que, por meio dela, a humanidade está grávida e espera o nascimento do menino Jesus? Desde o tempo da queda do Paraíso, a expulsão de Adão e Eva por terem comido do fruto proibido, a humanidade esperava a vinda do Messias para efetuar a inflexão fundamental de redenção. O pintor renascentista Fra Angélico em sua pintura “A Anunciação” representou de modo exemplar a importância desse acontecimento, ao colocar o foco principal no coração de Maria para onde se dirige o Espírito Santo na forma de uma pomba, que emana da mão de Deus com num raio de luz. E no canto superior esquerdo do quadro, há uma pequena representação da expulsão de Adão e Eva do Paraíso. Num único quadro temos esse magnífico percurso evolutivo da humanidade que vai da queda ao resgate. Outro elemento importante na imagem é a atitude de Maria, que após o espanto, a indagação, a incompreensão, acolhe em seu coração sua tarefa com uma inclinação devota diante do anjo anunciador, o Anjo Gabriel, cruzando os braços em seu peito em sinal de total entrega à vontade de Deus.
Essa atitude e gesto é a mais sublime indicação de como nós também podemos acolher em nossos corações a vinda do Cristo. Não consideramos essa festa como algo que nos remete ao passado, mas ao futuro, pois como a própria palavra “Advento” indica, trata-se da festa sobre o que há de vir. E mesmo, considerando que se refere a fatos ocorridos há mais de dois mil anos, a cada ano nós revivemos os acontecimentos e nos preparamos para receber o Cristo vivo. Ele não nos abandonou após sua ascensão, mas permanece disponível para todo indivíduo que o quer acolher. É nesse sentido que a humanidade permanece grávida de Cristo após todos esses séculos, e assim permanecerá até que todos o tenhamos acolhido. Enquanto isso, contemplamos a imagem da Anunciação com veneração e humildade, buscando a abertura da alma para essa recepção.

Carlos Maranhão

Reflexão para domingo, 28 de novembro

Época de Advento

Referente ao perícope de Lucas 21, 25-36

Iniciamos o novo ano cristão com as imagens daquele que é denominado “o pequeno apocalipse”, ou “apocalipse do monte das oliveiras”.
Ele dá o tom, torna-se o lema do novo ano ao passarmos pelo portal que nos conduz a mais um círculo, mais uma ciranda de perícopes.
Ele preenche o ano cristão com algumas mensagens:
“O ocaso exterior pode vir a ser a aurora do âmago da alma” Rudolf Steiner
“Para recebermos a luz do Natal corretamente, temos que passar pelas tribulações do ocaso e ao mesmo tempo buscar nelas um vislumbre do reluzir do futuro”. Hans Werner Schroeder
Ao nos conscientizarmos das próprias palavras do Cristo: “O céu e a Terra passarão, mas não passarão as minhas palavras”, poderemos criar um caminho de exercício ativo no ouvir (ler) as palavras do evangelho. Através delas flui a força vital do Cristo para os nossos corações.
Domingo a domingo deste novo ano poderemos perceber como a leitura do evangelho contém em si a irradiação da realidade espiritual. A cada domingo recebemos um raio de sol e ao final do ano cristão estaremos envoltos (vestidos) do próprio sol. É nessa realidade espiritual que a força de vida pura do Cristo se faz presente.
Depende de nós nos voltarmos para a fonte que emana os raios solares.

Viviane Trunkle

Reflexão para o domingo, 21 de novembro

Época de Trindade

Referente ao perícope de Apocalipse 21


Quando no inverno severo a vida já se retirou da atmosfera e as folhas caíram e pereceram no chão, os botões de muitas árvores já estão prestes a anunciar o futuro e novo ciclo de vida! Como é tão diferente quando o ser humano olha hoje para a extensão da destruição da natureza em vários locais da Terra, bem como para a miséria de tantas pessoas com fome e em fuga, e para os abismos sombrios da alma humana! Será que nestas situações ainda se pode reconhecer algo que poderia inaugurar uma nova fase de vida?

Estará a humanidade à beira da decadência total, da destruição total? Será que o nosso legado para as próximas gerações será apenas a falta de esperança e perspectiva?

Ao escrever o Apocalipse, João se encontrava numa profunda crise de vida. Tinha sido banido para sempre para o exílio na natureza inóspita e selvagem da ilha de Patmos, para a solidão. Além disso, a perseguição impiedosa dos cristãos estava se espalhando por todo o Império Romano.

No entanto, não tinha João estado ao lado de Jesus Cristo na Última Ceia? Também como testemunha ao pé da cruz, não foi ele que ouviu então as palavras de Cristo? Não foi ele que viu o sangue vivo fluir do Seu coração após o Seu último suspiro? Não encontrou ele o Redentor, o Novo Homem, que muito lhe ensinou nos 40 dias da Páscoa? Assim, naquele domingo em Patmos, o véu, que geralmente encobre o mundo espiritual, se desvendou para João, para o discípulo amado!

Das nuvens escuras surgiu para João a figura reluzente do Filho do Homem, como um botão, um rebento de uma nova humanidade, de uma nova Terra. O Filho do Homem, que foi, que é, que virá a ser. Ele abarca todos os ciclos dos tempos em Si mesmo, passado, presente e futuro, o começo e o fim! Ele é, ao mesmo tempo, evolução e superação. Ele sustenta o ser humano na morte, nas trevas e na destruição, para levá-lo para a vida, para a luz e para um novo amanhecer! O Filho do Homem, o Redentor, passou a ser, para João, a verdadeira realidade em que a humanidade vive. Esta realidade só pode ser percebida com os olhos interiores da alma humana. Desde então, pode-se dizer que foi inaugurada a descida do que virá a ser a Nova Jerusalém e a nova humanidade. Através DELE poderemos contribuir para a continuação do sacrifício de amor no Gólgota, para a salvação, ou seja, para a transformação e espiritualização da Terra e da Humanidade.

Podemos imaginar que João se fortaleceu na contemplação da majestade do Filho do Homem, como descrito no começo do Apocalipse. No entanto, não lhe foi poupado vislumbrar quais os desafios que necessariamente aparecerão no futuro para o ser humano e para os mundos espirituais. Vislumbrar, sobretudo, os desafios do ser humano ao se deparar com os seres espirituais adversos, que atuam para o mal, querendo impedir que a humanidade alcance sua meta espiritual. Estes seres espirituais são muito mais poderosos do que o ser humano! Eles atuam cada vez mais destrutivamente na civilização humana, sobretudo através da técnica, do comércio e da indústria. Sim, estes são os âmbitos da atividade humana em que penetramos mais profundamente nas cadeias da matéria e esquecemos o espiritual. Pode-se dizer que a característica principal da nossa civilização se encontra nesta atuação destrutiva dos seres adversos, que antes da época cristã ainda se encontravam controlados por outras entidades divinas do bem.

João teve que ir se fortalecendo para enfrentar e aceitar todos os desafios manifestos pelo Apocalipse. Ele mesmo foi chamado no Apocalipse a digerir o Evangelho, para que este se tornasse uma parte de sua própria natureza. Nós também podemos nos fortalecer contemplando o Apocalipse na última época do ano cristão, antes que o novo ano cristão se inicie com a celebração do Advento. Temos que aceitar este fato de que o ser humano irá cada vez mais se deparar com as forças do mal. Isto significa que ele também sucumbirá ao mal, mas que terá com o Cristo a oportunidade de vir a conhecer a natureza das forças adversas, para que possa superá-las e, assim, construir a partir do espírito, ou seja, de cima para baixo, a Nova Terra, a Nova Jerusalém. Um grande esforço será exigido do ser humano a partir de agora. Sempre elevar os seus pensamentos, sempre estar alerta para os avanços constantes do mal, alerta para decidir pelo bem, como um seguidor de Cristo. Neste esforço, a alma humana irá se transformando e vestindo a sua natureza cósmica de noiva do espírito. Somente com Cristo poderemos enfrentar os desafios do futuro e construir a nova existência a partir do espírito.

Jesus Cristo disse: “Eu sou o caminho, a verdade e a vida”. Quem se tornar Seu seguidor, quem procura a verdade, quem quer dar a sua vida pela Sua obra, poderá vê-lo, mesmo quando tudo se encontra num processo de decadência e de morte. Com e por Ele, surge no interior da alma humana o novo, a vida eterna. O velho mundo, a velha Terra, lá fora, não existirá mais, mas sim o ser humano em comunhão com Deus e com todos os seres divinos. Esta é a Nova Jerusalém, no meio da qual brota a fonte da água da vida.

Helena Otterspeer

As duas imagens são de manuscritos do Apocalipse dos séculos X e XI, com comentários de monges cristãos que se retiraram para conventos nas fortalezas rochosas ao norte da Espanha para resistir à invasão árabe e sua predominância religiosa na península ibérica. São testemunhos de uma tradição artística inédita, estilo denominado de moçarábico, ou seja, de influência visigoda e ao mesmo tempo árabe, mas com conteúdos cristãos. Esta resistência levou ao êxito da ”reconquista” e expulsão dos árabes da península ibérica. Nesta época estes monges inauguraram o caminho de Compostela para que os fiéis se fortalecessem na sua fé.

Figura 1: O Filho do Homem com os sete candelabros acima, e as sete estrelas ao lado, tocando João para que ele não se aterrorizasse. Na parte de baixo, João leva as cartas para as sete comunidades.


Figura 2: Apocalipse 12: A virgem cósmica pronta a dar à luz, ameaçada pelo dragão de sete cabeças e a luta da legião de Micael contra a legião do dragão. A legião do dragão sendo arremessada para a Terra.

Reflexão para domingo, 14 de novembro

Época de Trindade

Referente ao perícope de Apocalipse de João 7, 9-17

Antigamente as roupas eram lavadas à mão e depois colocadas ao sol. O sol as branqueava e secava.

Precisamos também lavar e branquear as roupas do nosso ser, da nossa alma e do espírito. Esse processo requer um intenso trabalho. Durante a vida passamos por muitos momentos difíceis, por tentações e muitos erros. Isso faz parte do caminho da vida e de nosso desenvolvimento. Aprendemos através dos nossos erros e, no processo de aprendizagem, pouco a pouco lavamos as nossas roupas. Assim nós nos preparamos para o encontro com o Cristo. Ele, como ser solar, nos acompanha e guia para prepararmos e vestirmos nossas roupas brancas. Diferente das roupas colocadas ao sol, nós precisamos ser ativos em todo esse processo. Pouco a pouco vestiremos as roupas brancas e serviremos cada vez mais ao Cristo.

Julian Rögge

Reflexão para o domingo, 7 de novembro

Época de Trindade

Referente ao perícope de Apocalipse de João 3

As sete estrelas são as estrelas pelas quais entendemos o que o homem é hoje e o que ele deverá se tornar no futuro. Sardes corresponde à nossa época, a quinta igreja, a quinta época pós-atlântica, a época da alma da consciência. E isso significa saber que em nosso tempo, quando se desceu mais profundamente na matéria, trata-se agora de elevarmo-nos à vida espiritual. As sete estrelas nos guiam nesse caminho espiritual. É importante para nós que justamente em nossa época, possamos nos conscientizar do perigo de entregar-se à morte em vida. A visão materialista de mundo não é outra coisa, a não ser essa pulsão de morte.
Vivemos numa época extremamente rica, pois ela marca justamente a transição para o despertar do espírito. Queremos, no futuro, fazer parte desse grupo dos que foram capazes de purificar suas almas para poder vestir as vestes brancas e poder ter o seu nome escrito no livro da vida. Essa é a meta de perfeição à qual nos aponta a mensagem apocalíptica. Ela não indica o fim dos tempos, mas o início dos novos tempos em que o ser humano se encaminha, com a forca de Cristo, à superação da morte, à celebração da vida.

Carlos Maranhão

Reflexão para o domingo, 31 de outubro

Época de Trindade

Referente ao perícope do Apocalipse de João 1, 9-20

Desde o nascimento estamos em um caminho de desenvolvimento. Aprendemos a andar, a falar e a pensar. Em um ambiente saudável esses processos acontecem naturalmente. Os recebemos como uma semente que cresce em nós. No percorrer da vida precisamos tomar o nosso desenvolvimento cada vez mais nas próprias mãos.

Hoje lemos sobre a grandiosa imagem do filho da humanidade. Nele aparece a meta do desenvolvimento humano. Desde o mistério do Gólgota temos a semente para esse desenvolvimento em nós. A semente das forças crísticas. Diferente do começo da nossa vida, ela não vai se desenvolver naturalmente. Para chegar a meta de desenvolver as forças crísticas em nós, são necessários todo nosso esforço e toda a nossa perseverança. Com momentos de silêncio, orações e com os sacramentos, fortalecemos a semente. Pouco a pouco ela crescerá e nós nos desenvolveremos para o futuro da humanidade.

Julian Rögge

Reflexão para o domingo, 24 de outubro

Época de Micael

Referente ao perícope da Carta de Paulo aos Efésios 6

Longino — Mosaico da igreja do convento de Nea na ilha grega de Chios – século XI

Já no momento da morte de Jesus na cruz surge pela atuação do soldado romano, conhecido na coletânea de lendas medievais e no apócrifo de Nicodemus, como Longino, a figura do cavaleiro a serviço de Deus, que mais tarde se tornará o cavaleiro do Graal, a serviço da obra de fortalecimento da Terra e da natureza humana pelo sangue de Cristo. Esta figura também inspirou os templários entre os séculos XII e XIV, que eram ao mesmo tempo monges e cavaleiros e que se designavam como pobres cavaleiros de Cristo. O sangue do Graal, recolhido por José de Arimateia no cálice da Última Ceia, não é o sangue que correu dos seus flagelos e das feridas nas mãos e pés pelos cravos da Cruz, mas especificamente daquela ferida causada pela lança de Longino logo após o último suspiro, da morte de Jesus na cruz. A lança de Longino transpassa o corpo de Jesus pelo lado direito até o coração e abre as comportas para o fluxo desta nova substância viva, que agora deve jorrar por toda a Terra, o sangue de Cristo, a matéria completamente transformada pela força divina, a substância que supera as forças da morte e das trevas, a substância de vida primordial e da vida eterna. Longino, descrito na lenda como cego, passa a enxergar e se torna um cristão. No evangelho de João se descreve sucintamente este momento tão enigmático, em João 19,33-37. Os soldados romanos estavam prestes a quebrar as pernas de Jesus na cruz, segundo as normas romanas da crucificação. No entanto, a profecia dizia que seus ossos não seriam quebrados, como assim também, há séculos na celebração da Páscoa judaica, não eram quebrados os ossos do cordeiro Pascal. De uma maneira enigmática parece que a ressurreição dependia da integridade dos ossos no corpo do Messias. Sabemos realmente que dentro da substância morta dos ossos,  na medula, se forma a substância viva do sangue. Neste momento decisivo, como por uma inspiração divina, como retrata o olhar de Longino no mosaico acima, ele impele a sua lança, que transpassa o coração de Jesus, impedindo assim a ameaça da quebra dos ossos. Da ferida do cadáver flui inesperadamente sangue e água. Isto de um corpo morto inerte, de maneira tão surpreendente que, segundo as palavras do evangelho, quem vê reconhece a verdade e com isto encontra a fé. Segundo as visões de Catharina Emmerich, que sofria as dores da Paixão de Cristo pela sua estigmatização e podia com isto testemunhar, como um contemporâneo daquela época, os acontecimentos do Calvário, o sangue que saiu desta ferida jorrou com toda pureza e transparência, como de uma fonte de água viva, tendo sido acolhido por uma rocha ao pé da cruz, onde pôde ser coletado pelas mulheres, testemunhas do martírio, e mais tarde da ressurreição. O sangue divino foi liberado dos limites estreitos do corpo mortal de um ser humano, podendo ser integrado nos amplos círculos climáticos da Terra, na circulação da água de rios e mares com a atmosfera e as nuvens da Terra. Este sangue está completamento curado das forças do egoísmo e pode servir às forças divinas e cósmicas do amor. A Terra acolhe este sangue que flui do coração de Jesus, mas também mais tarde, na hora da descida do corpo de Jesus da cruz, José de Arimateia também o fará, se tornando assim um portador do Graal, da força transformadora do sangue de Cristo, do seu Eu divino. O ser humano que serve o Cristo se torna um portador do Graal, um cavaleiro do Graal. A lenda conta que José de Arimateia, por sua vez também seguindo uma inspiração divina, vai levar o Graal, o sangue de Cristo, para o Ocidente, espalhando gotas no solo desde o sul da França até as regiões mais ao norte da Irlanda. Com isto ele prepara o solo da Europa, mas também seus povos e aqueles que para lá migram, para que possam acolher mais tarde a palavra do evangelho, a palavra viva do Redentor. Posteriormente não se tem mais notícias do Graal, ele desaparece, pois agora não se encontra mais como uma substância viva no exterior, mas sim uma substância viva no interior, na alma do ser humano, no coração do cavaleiro do Graal.
Esta imagem de um cavaleiro a serviço de Deus tem sua origem nos mundos divinos, onde Micael dirige seus exércitos para lutar com as forças do dragão. Ele vence a batalha e joga o dragão e seu exército para a Terra. Como assim? Que enorme desafio Micael e seu exército jogam e deixam para a humanidade e para Terra! Isto é incompreensível, talvez até mesmo inaceitável vindo da parte dos seres divinos! No entanto, os atos dos exércitos celestes que não são tão compreensíveis para a lógica humana, refletem sempre uma necessidade, uma justiça dentro do mundo divino e cósmico. Assim chega a época no desenvolvimento da Terra e da humanidade em que as forças dos seres adversos, dos seres do mal não podem mais ser contidas pela regência divina, mas são um desafio para a alma humana, para o Eu Sou, que foi instituído por Cristo e poderá compartilhar das suas forças da ressurreição com a alma humana. Devemos às forças adversas o fato de podermos nascer como seres humanos, como cidadãos da Terra, abandonando a existência pré-natal em comunhão com o espírito. Na Terra, no entanto, poderemos encontrar o Cristo e servir à sua obra divina. Também devemos a estes seres do mal o fato de morrermos, o que por outro lado nos permite uma vivência do mundo pós-morte e, com a ajuda de Cristo, a formação de um novo carma para a próxima encarnação, ou seja, uma chance de desenvolvimento futuro. O processo exterior que acontece no corpo de maneira inconsciente entre o nascimento e a morte deverá no futuro acontecer de maneira consciente no interior da alma humana, ou seja, conduzir as forças do mal para que o bem possa persistir. Portanto, o desafio do futuro será que o ser humano se depare com as forças do mal, aprenda a reconhecê-las e a superá-las com as forças da ressurreição, com o Eu do Cristo. Cristo realizou seu ato de amor para permitir ao ser humano enfrentar este desafio no futuro.
As forças do mal não estão mais, como antes do advento do Cristo, controladas e compensadas por forças divinas para servir o bem. Elas foram liberadas e estão agora nas mãos da humanidade, predominando na ciência, na técnica, na industrialização e no comércio*. Todas as descobertas que envolvem eletricidade, magnetismo e radioatividade, ou seja, de origem técnica, estão a serviço das forças adversas. Isto traz consigo uma destruição do organismo vivo da Terra, um enfraquecimento da existência física do ser humano. Isto é inevitável, pois não poderá ser revertido por nenhuma atitude de retorno a uma existência „natural“. Devemos portanto estar preparados para aguentar uma época em que não será mais possível voltar ou recuperar a integridade exterior da vida original terrena. A integridade deve ser procurada numa relação interior da alma humana com o Cristo, para que, num plano superior, uma nova Terra e uma nova humanidade sejam possíveis no futuro. O ser humano do futuro será um cavaleiro a serviço do Cristo, do seu Eu superior e a sua armadura, a sua espada, o seu escudo e elmo serão qualidades da sua alma, que vai se espiritualizando pela atuação do Eu do Cristo, se iluminando, se purificando, se fortalecendo para enfrentar as forças exteriores de declínio cultural! Os templários tinham o costume de assistir à missa como cavaleiros, montados em seus cavalos. Nós também podemos aprender a vestir a armadura de cavaleiro, a nos preparar para lutar com o escudo e a espada de Cristo, celebrando o Ato de Consagração do Homem, recebendo o pão e o vinho como corpo e sangue de Cristo.

Helena Otterspeer

*conferências de R. Steiner da GA 177 dos dias 6 e 7/10/1917 em Dornach

Alexandre, o Grande de Rembrandt

Reflexão para o domingo, 17 de outubro

Época de Micael

Referente ao perícope de Apocalipse 19, 11-16

“O que há em um nome? Aquilo que chamamos de rosa por qualquer outro nome teria um aroma igualmente doce. ” Shakespeare. E, no entanto, somos distintos das rosas e o nome nos indica uma identidade, dirige-se a alguém muito particular e individual, ainda que outras pessoas possam ter o mesmo nome, no meio em que vivemos somos chamados por esse nome com o qual nos identificamos. Mas essa ainda é uma identidade provisória, exterior, não ainda condizente com o nosso verdadeiro ser. O fato é que cada indivíduo é como uma espécie em si. O nome que só pode ser chamado por aquele que se refere a si mesmo é “Eu”. E isso indica uma autoconsciência à qual o ser humano chegou não faz muito tempo e que, no entanto, ainda não está plenamente desenvolvida. O cavaleiro que vem montado num cavalo branco, tal como está descrito no Apocalipse 19, apresenta vários nomes: “Fiel e Verdadeiro”, o “nome que ninguém sabia, senão ele mesmo”, ou seja o “Eu sou”, “Palavra de Deus”, ou seja o Logos, e finalmente “Rei dos Reis e Senhor dos Senhores”. O nome da rosa pode ser arbitrário, mas o nome de cada indivíduo humano que se escreverá nas estrelas, este é próprio de cada um e só será escrito quando este “Eu” alcançar a plena consciência de ser filho de Deus. Para isso veio o Cristo ao mundo para reger com a espada de fogo que sai de sua boca, ou seja a palavra de Deus. O nosso vínculo com ele é o meio pelo qual aprendemos a reconhecer pouco a pouco quem realmente somos, ou seja o nosso verdadeiro nome.

Carlos Maranhão