Reflexão para o domingo, 1° de setembro de 2024

Referente à perícope do Evangelho de Lucas 17, 20-37

O Evangelho nos conta de momentos decisivos da humanidade. Ele relata como as pessoas não estavam preparadas e não percebiam os sinais que os anunciavam. Elas estavam presas no seu dia a dia e não tinham a presença de espírito para atuar.

Como percebemos os sinais que anunciam os momentos decisivos? Precisamos olhar atentos para o mundo. O que ele quer nos mostrar? Quais sinais percebemos? Como atuarmos conforme as necessidades da situação?

É muito difícil fazer tais observações quando estamos na correria do nosso dia a dia. Precisamos criar pequenos momentos de observação e reflexão. Neles fica mais fácil percebemos os sinais do mundo e como deveríamos agir.

Nesses momentos podemos observar também o atuar do mundo espiritual. Ele está presente nos momentos decisivos da nossa vida e da humanidade. Estaremos atentos e preparados para atuar em conjunto com ele?

Julian Rögge

Reflexão para o domingo, 25 de agosto

Referente à perícope do Evangelho de Marcos 7, 31-36

Uma semente de maçã, ao germinar, torna-se uma macieira. A ordem da vida estaria abalada se essa semente não germinasse e do germe não se desenvolvesse uma macieira.
A ordem do mundo também estaria abalada se o Verbo Divino, tendo se feito carne e habitado em Jesus, não pudesse ser revelado num outro ser humano.
O surdo de nascença, sem as técnicas de aprendizado modernas e sem a linguagem gestual, nunca poderia ser o portador da palavra, nunca poderia se tornar um verdadeiro homem. Quando Jesus Cristo se aproxima da região de Tiro, a própria comunidade de vida do surdo-mudo o leva ao Verbo encarnado. A sua condição de vida abala toda a comunidade, que busca uma solução, uma cura. Não consiste a condição humana no desenvolvimento de qualidades para se tornar o portador do Verbo Divino no seu cerne interior, no seu Eu? Para isso, o ser humano tem que desenvolver o sentido para poder perceber a atuação da palavra divina no mundo, para ouvi-la e então poder anuncia-la.
Já no Paraíso, Adão e Eva ouviam as palavras divinas. Ao comerem do fruto da árvore do conhecimento do bem e do mal, algo próprio se misturou às suas percepções puras, ou seja, seus pensamentos e representações mentais pessoais. Com o advento do materialismo o “ruído“ mental causado pelos pensamentos materialistas na alma impossibilitam a percepção da atuação divina no mundo, da atuação do Verbo Divino. O ser humano moderno se tornou “surdo“ para perceber a palavra divina.
Só o encontro com o próprio Verbo Divino poderá reverter essa condição trágica.
Jesus Cristo conduz o surdo-mudo para um lugar à parte. Para as pessoas da época isso significava um processo de vivência da própria individualidade. Seus sentidos interiores começam a se abrir para essa experiência única. Jesus Cristo, ao tocar os ouvidos e a língua do surdo-mudo com a sua saliva, supera as barreiras de isolamento da percepção pelo tato que traz por um lado uma consciência da doença no surdo, por outro, uma experiência do que poderia ser a cura, ou seja, vivência da força primordial da criação no seu Eu Sou, a vivência do Cristo em si. Nesse momento, Jesus Cristo profere a palavra curadora: “abre-te“! E essa palavra cai na alma como uma semente de vida. A força divina dos céus jorra para a Terra e impregna o surdo com forças curativas! Imediatamente ele consegue falar perfeitamente.
Hoje as palavras dos meios de comunicação se espalham por todo mundo como replicadas automaticamente. No entanto, estamos surdos para ouvir a palavra divina, para ouvir a palavra do Evangelho com os sentidos da alma, não encontramos as fontes de cura e de paz.
Nos sacramentos Jesus Cristo nos leva a um lugar à parte, somos tocados de várias maneiras e podemos ter um encontro íntimo com Ele. Ele abre os nossos sentidos para o Espírito, Ele nos torna portadores da sua Palavra, da sua Vida. E hoje não podemos cansar de anunciar isso com muita alegria e dinâmica, em atos e palavras.

Helena Otterspeer

Reflexão para domingo, 18 de agosto de 2024

Referente o Evangelho de Lucas 18,35-43

Havia um cego à beira do caminho, que clamava por COMPAIXÃO!

Pedir “com-paixão” significa que esperamos que o outro sinta algo da nossa própria paixão”, do nosso próprio padecimento. Podemos pedir isto a alguém? Podemos pedir isto a Cristo?

O cego à beira do caminho pediu, insistiu, clamou mais alto até ser ouvido…

É um consolo para todos nós sabermos que Cristo ouve nossa voz e se interessa
pelo nosso sofrimento, pela nossa dor, e Ele o faz porque tem com-paixão pelo ser humano e quer ajudá-lo. Entretanto, é importante não esperar tudo passivamente.  Como o cego,
temos que ter a presença de espírito para perceber o que “passa” pelos
caminhos de nossas vidas; não deixar passar as oportunidades!

E então pode vir a pergunta: “… que queres que eu te faça?”

Não basta esperar que as forças divinas apenas olhem e sintam nosso padecimento ou nossos problemas e então tudo vai se resolver! Nós mesmos temos que ter clareza do que queremos.

Quantas vezes cultivamos nossas dores, gostamos de certos sofrimentos ou até nos sentimos bem sendo vítimas disto ou daquilo.

 
Por que o cego pedia com-paixão? Com certeza porque queria terminar com sua cegueira, queria experimentar, *ver*, a vida de maneira nova.

Ele não teve dúvida em responder: “… Senhor, que eu veja!”

Em todo processo de cura estes dois lados devem estar presentes: a vontade

de curar e a vontade de ser curado.  Cristo, aqu’Ele que traz ao mundo a força sanadora, é capaz de sentir a dor humana, mas só pode agir se desta dor nasce a vontade de transformar algo. Cristo sempre respeita a liberdade do homem.

“… e o cego começou a enxergar e seguia Jesus.”

O que vem depois?

O Evangelho não relata. Apenas se diz que aquele homem começou a seguir Jesus. Se prosseguirmos a leitura dos Evangelhos, veremos que Jesus ao passar por Jericó estava indo em direção a Jerusalém.

Ao chegar lá, podemos ler nos capítulos seguintes, têm início os acontecimentos da Semana Santa, a última semana de vida de Jesus, que culminam com sua morte na cruz.

Aquele homem, aquele ex-cego, desde então, seguia Jesus. Poderíamos imaginar que ele foi um dos muitos que o acompanharam até Jerusalém. O que ele viu lá, agora que podia enxergar?  A *paixão* daqu’Ele que o havia curado.

O cego iniciou pedindo compaixão e, de repente, depois de curado, ele mesmo é levado a presenciar o sofrimento do outro. Teria ele sentido COMPAIXÃO por Jesus?

Os evangelhos silenciam sobre isto…

Podemos, porém, refletir sobre nós mesmos. Quanto do que queremos ou desejamos mudar em nossas vidas – porque nos é incômodo ou doloroso – chegou a acontecer? Mas se chegou a acontecer, nos possibilitou ver as coisas de um modo bem distinto. O que fazemos depois de tais mudanças, ou mesmo depois de tais “curas”, depende em grande parte de nosso livre arbítrio.

Aqui, mais uma vez, o relato do cego de Jericó poderia nos levar à reflexão: ao pedir ao mundo espiritual que olhe para a nossa vida sofrida, temos a esperança de receber a força para mudar algo, mas, simultaneamente, teremos também a possibilidade de enxergar a dor e o sofrimento do outro e do mundo de maneira nova.

Quem clama por compaixão, merece recebê-la, mas estará também disposto a retribuir este olhar compassivo para o próximo?

Renato Gomes – Berlim, Havelhöhe

Reflexão para o domingo, 11 de agosto de 2024

Referente à perícope do Evangelho de Lucas 9, 1-17

Somos enviados como os discípulos. Enviados do mundo espiritual para a Terra. E como eles, não podemos levar nada. Mas, diferentemente deles, não nos lembramos da nossa meta de vida, da nossa tarefa aqui na Terra.

Durante a via terrena moramos na casa do nosso corpo. Ele nos dá a possibilidade de atuar no mundo. No momento da morte saímos dessa casa novamente.

Para que somos enviados para a Terra?

O envio dos discípulos nos dá uma indicação. Como eles somos envidados para anunciar a boa nova do reino dos céus. Para trazer o espiritual para a Terra. Para unir esses dois mundos e assim transformá-los.

Nesse caminho trabalhamos em harmonia com as forças celestiais e com todos que acordam para essa meta de vida. Trabalhamos para o futuro do Cosmo inteiro.

Julian Rögge

Reflexão para domingo, 4 de agosto de 2024

Evangelho de Mateus 7:1-14

Numa densa floresta ao entardecer, a luz dourada filtra-se através da copa das árvores altas,
lançando sombras salpicadas em um riacho tranquilo que flui suavemente sobre pedras lisas.
No primeiro plano, uma pessoa senta-se calmamente sobre uma grande rocha, meditando
com os olhos fechados, cercada pelos sons dos pássaros e pelo farfalhar das folhas. A quietude
e a tranquilidade da cena estimulam esse indivíduo a buscar a essência de não julgar e
simplesmente ser. Essa imagem nos remete ao chamado do templo de Apolo na Grécia antiga:
“conhece-te a ti mesmo”, que aponta, no transcorrer da história da humanidade, ao propósito
de o ser humano alcançar, no cume da sua evolução, o fundamento do seu próprio ser. 
Enquanto permaneço no dualismo da condição terrena, sem o vínculo com esse
fundamento, faço julgamentos sobre mim e sobre os outros, mas, desse modo, dificilmente
conhecerei a mim mesmo ou ao outro, pois eu não posso de fato fazer julgamentos. O preceito
de Cristo no Sermão da Montanha, “não julgueis para que não sejais julgados” não é apenas
um preceito moral a ser obedecido. Trata-se da condição natural do ser quando alcança a
plenitude do seu próprio ser. Ele não julga mais, ele só ama, e não é que ele ame por
obediência a um preceito, ele ama porque essa é a condição natural do seu ser. No ser puro
ele resgata a sua unidade com o todo, do qual se separou pelo pecado original, entendendo-se
este como viver num mundo separado do divino – um fato, na verdade, impossível, portanto
ilusório – o mundo de Maia. 
Na nossa vida comum, isso parece algo impossível, pois estamos sempre fazendo
julgamentos com base em sentimentos pessoais, ideias preconcebidas, crenças etc. Será que é
possível imaginar a liberação que poderia ser vivida, caso tivéssemos a experiência do puro
ser, desprendendo-nos de todas as amarras psíquicas, sociais, morais? Essa é a proposta de um
caminho meditativo, de silenciar esse ego julgador. Para isso, não necessitaríamos fugir do
mundo, exilarmo-nos como um eremita numa caverna, mas meramente ter a disposição de
separar momentos no nosso cotidiano para contemplar a natureza em busca de puramente
ser.

 Carlos Maranhão 

Reflexão para o domingo, 30 de junho de 2024

Evangelho de Marcos 1:1-11

Imaginemos um vasto deserto árido. O sol bate implacavelmente, o solo está rachado e seco, e o ar está denso com silêncio. No meio dessa desolação, um único broto verde emerge, um símbolo de vida e esperança onde nada parecia possível. Este é o cenário onde ouvimos pela primeira vez a voz poderosa de João Batista, clamando por mudança, anunciando a vinda de algo verdadeiramente transformador. João Batista é o precursor de Jesus Cristo, cuja voz ecoou no deserto, chamando as pessoas ao arrependimento. Mas hoje, enfrentamos um tipo diferente de deserto: o deserto de nossas almas. É um lugar dentro de nós onde nossos desejos mais profundos estão escondidos, sufocados pela secura de nossos tempos. Vivemos em uma era cheia de barulho e distração, onde a voz interior de nossa alma não encontra saída para se expressar. O chamado de João ao arrependimento não foi apenas um chamado para lamentar pecados passados. A palavra grega para arrependimento, “metanoia”, significa uma mudança de mentalidade, uma transformação de toda a nossa perspectiva. É uma mudança profunda em como vemos o mundo, a nós mesmos e a Deus. Nestes tempos difíceis, devemos permitir que este clamor por mudança penetre nas grossas camadas de negação que construímos ao nosso redor. O espírito de João Batista continua a atuar em nosso mundo hoje, preparando o caminho para recebermos Cristo em nossos corações. Ele nos desafia a entrar no deserto de nossa alma, a ouvir esse clamor interior por mudança e a abraçar uma nova maneira de pensar e viver. Então ouçamos a voz que clama no deserto. Encontremos a coragem de entrar nos lugares áridos dentro de nós, enfrentando a secura de nossos tempos e respondendo ao chamado por “metanoia”, uma mudança de mente e coração. Permitamos que Cristo transforme nossas vidas e renove nosso mundo. Ao nos prepararmos para receber Cristo em nossas almas, lembremo-nos de que, mesmo nos lugares mais desolados, uma nova vida pode surgir e a esperança pode florescer.  

Carlos Maranhão

Reflexão para o domingo, 23 de junho de 2024

Referente à perícope do Evangelho de Lucas 19:1-10
Zaqueu, o Sicofanta – delator de ladrões de figos

 Na antiga Atenas existiu a função de delator de ladrões de figos. Ou seja, alguém que denunciava pessoas que exportavam figos de Atenas sem permissão oficial. Em grego, o termo é: συκοφάτης (sykophántes), em português, sicofanta. Etimologicamente, sicofanta provém de duas outras palavras, sykon: figo e phaino: tornar evidente.

Um sicofanta era um informante pago, alguém cujo trabalho consistia em delatar outras pessoas. Com o tempo, a palavra passou a ser usada também para os caluniadores, para os chantagistas, posto que muitos sicofantas se aproveitavam da situação para chantagear. Depois, ainda no mundo grego antigo, a palavra passou a ser usada também como insulto.

No relato do Evangelho de Lucas, ouvimos falar de um chefe dos coletores de impostos, Zaqueu, que subiu num sicômoro (um tipo de figueira) para ver Jesus. Em conversa com Cristo, em sua casa, Zaqueu se reconheceu como um sicofanta, um chantagista, mas que estava determinado a mudar e restituir quatro vezes mais à pessoa que enganou ou chantageou.

Zaqueu, o sicofanta, que se tornara um chantagista como os delatores de ladrões de figos, havia subido numa figueira. Em cima da figueira ele foi visto, Zaqueu foi reconhecido no fundo de sua alma por Cristo. Cristo o chama pelo próprio nome, pois o reconheceu. Ele reconheceu nele o chantagista. Ele viu em cima da figueira o delator de ladrões de figos.

E Cristo lhe disse: “Desce rápido daí!” Zaqueu, que fez fortuna à custa dos outros, que construiu sua existência em cima da chantagem, em cima da ganância, precisa primeiro descer de cima da figueira, ele precisa abdicar do que fazia. E Zaqueu fez isso. Ele desceu e convidou Jesus para entrar em sua casa. 

Há três momentos importantes nessa história: O ser humano Zaqueu (1) que se mostra, dá-se a conhecer, (2) que está pronto para descer, para fazer uma mudança na vida e (3) que o convidou à sua casa.

O ser humano muitas vezes gostaria de poder ter um encontro, em sua alma, em seu espírito, com o Cristo, com o  Filho de Homem. Gostaríamos de convidá-lo a nos visitar. Entretanto, antes de convidá-lo, como na narrativa de Zaqueu, devemos também estar cientes de que primeiro é preciso mostrar-se, deixar-se reconhecer (ou, em termos modernos, praticar o autoconhecimento) e que também é preciso estar preparado para descer, estar pronto para mudar e transformar o que ainda está turvo na alma. Só então, após o autoconhecimento, após dar início a transformação, podemos convidá-lo. Porque o Filho do Homem veio buscar e salvar o que no ser humano se extraviou e se perdeu.

Renato Gomes

Reflexão para o domingo, 16 de junho de 2024

Referente à perícope do Evangelho de João 1, 43-51

Quando Natanael ouve o relato de Felipe, ele duvida. Poderia sair algo bom? Mesmo assim, ele fica aberto, encontra o Cristo, é reconhecido e reconhece o Cristo como o esperado Messias.

No nosso dia a dia, nos encontros com outras pessoas, passamos por esses passos. Primeiro duvidamos. Pode sair algo bom desse encontro? Se estivermos abertos, criamos a chance de sermos reconhecidos e de reconhecermos o outro. Algo novo pode se formar no encontro.

Na relação com o mundo espiritual, com o Cristo, podemos passar pelos mesmos passos. Primeiro duvidamos. Ficando aberto, damos a possibilidade de sermos reconhecidos e de conhecer o mundo espiritual, pouco a pouco. Assim, pode se realizar o que Cristo promete para Natanael: que vimos o céu aberto e as hierarquias celestiais descendo e atuando aqui na Terra.

Julian Rögge

Reflexão para o domingo, 9 de junho de 2024

Referente à perícope do Evangelho de João 3 – A samaritana no poço

A alma humana foi concebida por Deus, foi escolhida e predestinada para ser a noiva, um dia ornada para o seu matrimônio com o Espírito, para a sua união mística com o divino. Essa foi realmente a imagem vislumbrada por João Evangelista em Patmos na sua visão do Apocalipse. A nova Terra descia do céu, a Nova Jerusalém chegava como uma noiva enfeitada. Justamente a noiva estava ornada, pois sua corporalidade não estava restrita à sua natureza terrena e transitória, mas estava vestida com vestes espirituais, vestes tecidas pela luz do Cristo. Como Paulo falava: devemos nos vestir com o Cristo. De fato, os primeiros cristãos batizados se vestiam de branco para celebrar a eucaristia.

Esse vestido de noiva é tecido pelo Eu Sou em Cristo, na medida em que supera a estrita natureza transitória da alma e fundamenta sua existência no espírito. Com essa veste de luz a noiva estará apta para celebrar a união mística com o Cristo, conquistando a vida eterna. Essa veste brilhará pelas qualidades do amor, da fé e da esperança.

Para que isso aconteça e se torne uma realidade, Cristo se dirige várias vezes a cada um de nós no caminho da vida, pedindo de beber. Essa bebida que oferecemos ao Cristo é a nossa “confissão” – nosso reconhecimento de sua natureza divina e nossa disposição para segui-lo. E na medida em que oferecemos essa bebida, recebemos nós mesmos do Cristo o cálice com o seu sangue, o vinho transfigurado, a água da vida eterna.

A samaritana é a representante da alma humana, que ainda está muito apegada à sua condição terrena, mas por outro lado, tem um sentido inato para o sagrado, para o divino. Jesus Cristo é o representante do Eu Sou, o noivo místico.

Geralmente a noiva se prepara bem cedo para o casamento. Também a alma humana, desde que despertou no íntimo do ser humano, vem se preparando, desde as antigas culturas pré-cristãs, para o matrimônio com o espírito. Nessas culturas, essa união se dá pela orientação e guia dos mundos espirituais, até que essas vão se esgotando e o laço com o mundo divino fica ameaçado de se romper. Em compensação, a consciência individual desperta e com isso a chance do verdadeiro e eterno casamento místico. Ele se dá na luz do autoconhecimento, na luz que revela as origens e também as metas espirituais da humanidade. Essa luz se revela no encontro da alma individual com o Cristo, como o encontro da samaritana com Jesus Cristo, que se dá no coração da Palestina, na Samaria, entre o polo de vida da Galileia (o mar da Galileia) e o polo de morte da Judeia (o mar Morto). O encontro se dá no momento presente, entre o legado do passado e o apelo do futuro.

O encontro não se dá num determinado ponto geográfico, mesmo que sagrado. Ele acontece interiormente, num espaço livre de preconceitos e metas predeterminadas, no encontro com a verdade. É assim que a samaritana começa a se ligar com o Cristo e imediatamente se torna sua seguidora. Ela anuncia o caminho para cada ser humano: estar sempre atento às perguntas e tarefas apresentadas pelo destino, cultivar o sentido para o espiritual, aprender a se guiar pela meta espiritual do futuro, que começa agora, viver com uma pergunta latente com confiança na providência divina. Anunciar a chegada do noivo!

Nós sabemos o caminho, basta agora nos colocar a caminho!             

Helena Otterspeer

Reflexão para o domingo, 2 de junho de 2024

Referente à perícope do Evangelho de João 3, conversa com Nicodemos

Todos conhecemos recintos ou ambientes que nos agradam. Por exemplo, um lugar onde regularmente nos encontramos com pessoas amigas, cuja companhia e as conversas nos agradam. Ou mesmo uma sala de aula ou de reunião, onde durante longo tempo ouvimos e aprendemos coisas que foram significativas para nós. Ou ainda um lugar de recolhimento e meditação coletivo, onde nos sentimos resguardados e serenos para orar ou
simplesmente mergulhar no silêncio. 

E de repente algo muda. Talvez um único aspecto, mas logo notamos que o ambiente se modificou: As cortinas foram retiradas, por exemplo, ou as paredes estão com outra cor, ou a qualidade da luz no recinto se modificou…

Como lidamos com tais mudanças? Sentimos a falta deste ou daquele elemento como uma perda? A mudança disto ou daquilo me incomoda?

Toda mudança potencialmente traz consigo um incômodo, mas traz também algo desafiador. Cada mudança em um ambiente familiar e protegido pode ser muito perturbadora, porque novos elementos desconhecidos
aparecem de repente ou alguns daqueles com os quais estávamos acostumados, já não estão mais lá. A questão decisiva, no entanto, é: O essencial mudou? Até que ponto posso aprender algo novo através de uma
mudança?

Voltando ao exemplo: Talvez, com as novas condições de iluminação no recinto, eu veja as cores e os objetos numa nova luz… Talvez eu perceba que, justamente por causa da mudança, preciso concentrar mais minha atenção no foco que me levou àquele lugar e não me deixar distrair demais por detalhes do ambiente.

A mudança pode então ser um elemento desafiador e ao mesmo tempo estimulante, para que eu aprenda ou desenvolva algo novo. Mudanças trazem consigo rupturas, mas também criam oportunidades para novas aprendizagens.

Este é um ponto essencial da conversa de Nicodemos com Cristo. Como pode uma pessoa, sendo velha, nascer de novo?

Envelhecer muitas vezes significa ater-se demasiado a coisas que se conhece bem, com as quais se está familiarizado. Nascer de novo significa estar pronto para deixar o antigo – mesmo que só um pouquinho. Abrir mão dele, soltá-lo. E assim estar disponível para se envolver com a novidade trazida pelas mudanças. Ao mesmo tempo levantar a pergunta: O que posso aprender com isso?

Nicodemos conhecia a antiga e sólida lei mosaica, bem como sua forma tradicional de interpretação. Cristo não rejeita a essência espiritual da lei, mas ele espera que Nicodemos perceba que existem outros caminhos para acessar este conteúdo, além daquele que lhe é conhecido e confiável. Mas para tanto é preciso renascer. É preciso certa flexibilidade interna, boa dose de alegria diante do desconhecido e acima de tudo boa vontade em querer aprender algo novo. A isto, Cristo chama “aqueles que nascem do Espírito”.

“O vento sopra onde quer, tu não sabes de onde vem nem para onde vai.” Tais ventos sopram fortemente no mundo de hoje. Se nos ventos das mudanças sentimos tão somente incômodos, corremos o risco de nos apegarmos somente ao que nos é conhecido. Se notarmos, porém, que há nestes ventos certos desafios para ver e entender algumas coisas de maneira nova, damos então a nós mesmos a oportunidade de aprender algo. Damos ao Espírito a chance, que ele prepare em nós o novo nascimento.

Renato Gomes