Reflexão para domingo, 12 de maio de 2024

Ascensão de Cristo, do retábulo de Vyšší Brod

Quarenta anos no deserto foram necessários para que o povo israelita pudesse estabelecer uma nova relação com seu Deus antes de alcançar a terra prometida. Deixaram o Egito onde conviveram com a pluralidade de deuses da mitologia egípcia para iniciar uma vida regida pelas leis divinas recebidas por Moisés. Agora se tratava de que cada um, cada membro do povo israelita vivesse de acordo com a lei em respeito e temor ao seu único Deus, Jahwe, na expectativa da vinda do único Messias. A relação com Deus vai se tornando uma relação de EU e TU. Assim vai se formando a alma individual, ela sendo predestinada a dar a luz ao Espírito Divino em si, ao EU SOU. Pelo EU SOU vai se estabelecendo a relação individual da alma humana com o Pai, com o Filho e com o Espírito Santo, com o Verbo primordial.

Quarenta dias foram necessários para que os discípulos de Jesus, nos encontros com o Ressuscitado fossem estabelecendo uma nova relação espiritual com o Cristo. Relação essa que vai se configurar como a relação com o Filho de Deus, o princípio ativo do Verbo primordial divino. A entidade divina mais transcendente vem a se manifestar no mundo sensível ensinando os discípulos como superar a morte da matéria.

Quando o Filho de Deus ascende aos céus para incorporar toda a Terra na sua obra de renovação e transformação, Ele escapa da vista restrita dos discípulos. Depois da Ascensão os discípulos o perdem de vista e uma profunda tristeza se apodera deles, uma profunda dor. Uma dor que os leva a se retrair para dentro de si. Dor que vai se revelar como as contrações do nascimento de um novo membro na alma humana, o EU SOU divino.

No EU SOU se manifesta no mundo temporal terrestre, na alma humana o Espírito eterno, a chama primordial de amor e sacrifício. Quando ela se rompe da alma dos discípulos é a chama de Pentecostes, que então vai começar a pular para outras almas fervorosas.

Os discípulos deixam de ser seguidores de Cristo para serem apóstolos, enviados do Cristo, continuando a sua obra de salvação e cura.

Nascemos no mundo sensível por obra do Pai, pela morte encontramos o Cristo para podermos despertar como Homem Espírito. Isto já aconteceu, isto pode continuar a acontecer apesar de todas as crises e catástrofes que não assolam!

Helena Otterspeer

Reflexão para domingo, 5 de maio de 2024

Referente ao Evangelho de João 16: 1-33

No meio do prado paradisíaco primordial, erguia-se uma árvore solitária, com seus galhos estendendo-se em direção ao céu, como suplicantes em busca da graça divina, a árvore da vida. Ao lado dela, outra cujo fruto lançará o ser humano na fatídica luta pelo conhecimento do bem e do mal, a árvore do julgamento. Aí estão as raízes da nossa jornada terrena, entrelaçadas com a própria essência da existência. À medida que atravessamos a paisagem das nossas vidas, a alma humana encontra-se enredada numa dança paradoxal entre a virtude e o vício, atraída inexoravelmente para o fruto da árvore do julgamento. Com cada escolha, cada decisão, navegamos no labirinto da moralidade, lutando com as complexidades do bem e do mal que definem a nossa condição humana. Mas entre as sombras da dúvida e do desespero, brilha um farol de esperança, um símbolo de redenção e renovação. É a cruz do Gólgota, outra árvore simbólica, onde Cristo, através do seu sacrifício e ressurreição, nos oferece a promessa da salvação.

Através da sua graça divina, voltamos a ter a possibilidade de acesso à árvore da vida, e as nossas almas podem ser libertadas das algemas do pecado que nos separam de nossa fonte primordial. Para isso somos agraciados com um dom sagrado: o Espírito Santo, enviado por Cristo para iluminar as nossas mentes e nos guiar para o despertar espiritual.

É através da nossa comunhão com Cristo, alimentada pela luz do Espírito Santo, que podemos ser convencidos, caso estejamos suficientemente despertos, da verdadeira natureza da nossa condição sujeita ao pecado, à justiça e ao julgamento; do pecado de não crer no Cristo, que é a nossa fonte de vida, da justiça pelo fato de ele ter ido ao Pai e poder agora estar disponível para todos nós e do julgamento por nos condenarmos junto com o príncipe deste mundo se preferirmos estar com este. Com esse discernimento podemos então livremente fazer a escolha pela redenção.

Vamos, então, atender a esse chamado, abraçando o poder transformador do amor de Cristo. Pois em nossa jornada rumo à árvore da vida, encontramos não apenas a redenção, mas também a promessa eterna da comunhão divina, distinta da original, pois no processo alcançamos consciência. 

Carlos Maranhão

Reflexão para o domingo, 28 de abril

Referente à perícope do Evangelho de João 14, 1-16

Um caminho nos leva a um lugar onde não estamos no momento. Caminhando nele, nós nos movimentamos da nossa posição atual para o lugar que está a nossa frente, no futuro. Estamos nos movimentando em direção ao futuro.
“Eu sou o caminho.” Assim Cristo se denomina, o caminho que leva até o Deus Pai. Que leva até as moradas na casa do Pai.
Como trilhamos esse caminho do Cristo, com o Cristo? Podemos nos preencher com a sua palavra, com ele mesmo, que é a Palavra. Podemos seguir o seu exemplo no nosso dia a dia. Por exemplo, reconhecer, como ele, o ser humano em cada pessoa que encontramos e a criação divina no mundo ao nosso redor.
Assim estamos, pouco a pouco, trilhando um caminho para o futuro. O caminho do Cristo que nos leva ao mundo espiritual, às moradas na casa do Pai. Esse mundo espiritual e essas moradas se realizarão aqui na Terra, como é descrito no Apocalipse de João na imagem da nova Jerusalém. Com o tempo reconheceremos o Cristo como nosso companheiro nessa caminhada rumo ao futuro da humanidade.

Julian Rögge

Reflexão para domingo, 21 de abril de 2024

Referente ao Evangelho de João 15, 1-27

À medida que o sol se põe no horizonte, lançando tons dourados sobre a paisagem tranquila, uma videira solitária ergue-se no meio de um vasto pomar. Seus galhos, adornados com cachos de frutas, balançam suavemente com a brisa noturna. Cada cacho de uva, um testemunho das forças invisíveis que atuam dentro da árvore, traz a marca de sua fonte de vida. Na tranquilidade do pomar pode-se sentir mais do que apenas a beleza da natureza; há um sussurro de algo mais profundo, algo eterno. Assim como a videira produz frutos sem esforço, ela também oferece uma metáfora para a condição da alma humana. Pois o ser humano, tal como a videira, encontra o seu verdadeiro propósito e realização não no esforço e no trabalho com as suas próprias forças, mas na entrega ao poder interior de Jesus Cristo. Sem esta ligação divina, os seus esforços são tão fúteis como a madeira e o feno, destinados a serem consumidos pelo fogo. No entanto, no abraço gentil de Cristo, há uma transformação, um derramamento natural de vida que transcende o esforço humano. Assim como a uva não precisa lutar para amadurecer, a alma também encontra sua expressão mais verdadeira quando simplesmente permanece em Cristo. Na tapeçaria do crescimento espiritual, não há espaço para frutos forçados, nem lugar para o esforço artificial que tantas vezes caracteriza a atividade religiosa. Pelo contrário, há um chamado à entrega, à confiança na mão invisível que guia e dirige, à permanência naquele que é a fonte de toda a vida. Nesta união sagrada, a alma encontra a sua expressão mais verdadeira, produzindo frutos que não são produzidos por ela mesma, mas sim pela vida divina que flui através dela. E assim permanece o convite do Cristo: “Permaneça em mim, e eu em você. Assim como o ramo não pode dar fruto por si mesmo, se não permanecer na videira, assim também você, se não permanecer em mim”.

Carlos Maranhão

Reflexão para domingo, 14 de abril de 2024

O bom pastor – Mosaico de Mausoléu em Ravena – Itália

Nos ritmos de sono e vigília, de atividade e descanso, alternam-se as fases de vida contemplativa e ativa da alma humana. Esse ritmo está fundamentado na própria natureza corporal humana, mas pode ser influenciado de acordo com uma cultura específica, uma vida religiosa específica. Do equilíbrio sadio desse ritmo vai depender não só a saúde física e psíquica, mas também a saúde do organismo social, o equilíbrio ambiental.

Uma profunda sabedoria vive em muitas correntes espirituais que reconhecem: o estado interior da alma humana, sua harmonia, equilíbrio, luz e virtudes ou a ausência delas se refletem, se espelham no âmbito social externo, nas instituições jurídicas, na relação entre as nações e mesmo no equilíbrio climático da natureza. Eremitas se retiram na convicção de que se dedicando ao aperfeiçoamento interior podem contribuir significativamente para a promoção do bem na humanidade e na Terra. Efetivamente há exemplos disso.

Na verdade, existe uma porta que ao mesmo tempo regula esse relacionamento intrínseco entre esses dois âmbitos – o do íntimo da alma humana e o do mundo – e também permite que cada um deles seja preservado. Quem abre essa porta, em que momento e com qual motivação? Isso vai determinar se isso será feito para o bem ou para o mal.

O bom pastor recolhe no momento adequado suas ovelhas para o descanso num lugar protegido e as conduz para fora para as relvas verdes e as fontes puras. Ele conhece suas ovelhas e sabe do que necessitam em ambos âmbitos. Elas por sua vez reconhecem sua voz e o seguem para o mundo.

Quem conhece melhor o mundo do que o Verbo Criador? Quem conhece melhor a natureza humana do que a palavra divina que se encarnou em Jesus? Ele veio a se confrontar com os seres adversos que estão sempre aspirando a se servir do ser humano para seus fins, veio a conhecer todo tipo de doenças que assolam a humanidade, todo tipo de sentimentos e pensamentos da alma humana, enfim os extremos da decadência da civilização humana. Ele proferiu as palavras de cura, de paz, de perdão, de esperança! Ele conhece as puras fontes de vida espirituais que se abrem na relação da alma humana com o Cristo e com o Pai divino.

Hoje vivemos uma época em que o despertar e o desenvolvimento do Eu na alma humana traz grandes desafios. Sem uma condução espiritual, o Eu se transformará no Ego, no egoísmo desenfreado que minará consecutivamente a alma, então a humanidade e enfim toda a vida na Terra. No entanto, o sol do Cristo brilha no horizonte. À luz desse sol podem se encontrar e conviver todos os Eus individuais, que então se reúnem em comunidades espirituais para atuar no mundo. O Eu do Cristo, o Espírito do Cristo é grande, abarca em si todos os Eus individuais. Seguir o Cristo e servir à obra do Pai nos conduz às fontes puras da água da vida. Ele é o bom pastor. Nos cabe ouvir suas palavras, conhecer cada vez melhor a sua voz e passar pela porta, quando Ele a abriu! Na oração se pode fazer ecoar a sua voz dentro da alma! Na procura do conhecimento superior pode-se vislumbrar os seus caminhos. Então o próprio Eu viverá no Eu do Cristo. Então haverá paz e vida eterna!

O mundo todo estará reunido numa comunidade de vida!

Helena Otterspeer

Reflexão para o Domingo, 7 de abril de 2024

Referente à perícope do Evangelho de João 20, 19-29

Tomé é aquele que quer ver, quer tocar, somente assim ele consegue ter a certeza de que o Ressuscitado é “real” e não o fruto de uma ilusão subjetiva de seus amigos…

Tomé não é muito diferente do ser humano moderno, pois como ele queremos apoiar nossas experiências e vivências naquilo que nos dão os órgãos sensoriais: naquilo que vemos, que ouvimos, que tocamos, que sentimos o perfume ou o gosto…

Segundo o relato do Evangelho de João, Cristo exorta Tomé a se aproximar para tocá-lo. “Meu Senhor e meu Deus!” – exclama Tomé. Com certeza, uma experiência profunda e incomum, pois como seria tocar o
“divino”?

Há algum tempo foram se introduzindo em nosso cotidiano os modernos aparelhos de comunicação e através de uma tecnologia espetacular, com simples toques de dedo, conseguimos abrir imagens, escrever mensagens, tirar fotos e muito mais. Algo impensável há algumas gerações, tais aparelhos não
são, há muito, exclusividade dos adultos, tornaram-se ferramenta e brinquedo de jovens e crianças, estão em todos os lugares…

O que tocamos aqui? O que colocamos em evidência? O que vemos?

De um modo geral, podemos chamar tudo isto de mundo virtual. Em contraposição ao que é real, o que se descortina através destas tecnologias pertence ao âmbito artificial, pois as formas e cores não são de fato uma janela para algo existente em si, apenas uma imagem cujo objeto real encontra-se em outro lugar (embora tenhamos também que levar em conta que cada vez mais nesse mundo virtual temos que nos perguntar se o que se apresenta ao toque de dedo, de fato, é imagem de algo existente ou uma pura invenção tecnológica, sem nenhuma relação com a realidade, muitas vezes sem conexão com a veracidade dos fatos).

Hoje vivenciamos algo que de certo modo se contrapõe à experiência de Tomé: tocamos algo real – a tela, a superfície do aparelho – e percebemos depois algo virtual, muitas vezes ilusório. Contudo, a questão do discípulo permanece: como é possível “tocar” algo sutil, imaterial e então ter a experiência de perceber que a essência do que “tocamos” é real? Damo-nos por satisfeitos com a realidade virtual que cada vez mais cresce à nossa volta? Se respondemos que sim, então não precisamos nos ocupar da questão de Tomé.

Ou nos perguntamos, quais outros sentidos, quais outras habilidades temos que desenvolver para, como Tomé, poder tocar e reconhecer a manifestação do Espírito, mas não como algo ilusório ou puramente subjetivo.

Viver com esta questão, é um desafio para todos nós. E tudo que pudermos aprender e experimentar nessa direção, nos ajudará a perceber o que subjaz na força real do Cristo Ressuscitado que emana para a vida do mundo.

Renato Gomes

Reflexão para o Domingo de Páscoa, 31 de março de 2024

Referente à perícope do Evangelho de Marcos 16, 1-18

O sol de um novo mundo começou a brilhar na manhã da primeira Páscoa. No começo, as mulheres e os discípulos tinham dificuldades de reconhecer esse brilho. Eles estavam presos à tristeza e às preocupações da vida. Aos poucos eles abriram os olhos para a nova realidade.

Temos ainda as mesmas dificuldades. É difícil reconhecer o sol do novo mundo. Muitas vezes estamos presos à tristeza e às preocupações da vida. Não conseguimos abrir os olhos espirituais.

Na Páscoa somos chamados para abrir os olhos para essa nova realidade. Cristo verdadeiramente ressuscitou! Ele ressuscitou para ajudar cada um de nós. Ele abriu para a humanidade um novo caminho pela morte. A cada Páscoa, Cristo deixa brilhar um pouco mais o sol do novo mundo.

Julian Rögge

Reflexão para domingo, 24 de março de 2024

Uma profecia é uma mensagem do mundo espiritual sobre acontecimentos significativos no futuro. Hoje os verdadeiros profetas são raros. Nas culturas antigas, as profecias eram dirigidas a um povo ou a uma comunidade religiosa. Em festas religiosas cultivava-se tanto a memória de grandes acontecimentos do passado como também a expectativa pelos acontecimentos futuros, para os quais se deveria estar preparado.

Já havia quase mil anos que o povo israelita festejava no templo em Jerusalém a festa da Páscoa, em memória ao êxodo, à libertação da escravidão no Egito e com grande esperança pela chegada futura do Messias. Com o Messias chegaria também o reino do céus à terra e na concepção do povo israelita a tão aspirada liberação do domínio romano, de qualquer domínio estrangeiro.

A hora havia chegado para o cumprimento da antiga profecia. No ano 33 da nossa era, no primeiro dia da semana na cidade santa havia um pressentimento no ar. Era como se o sol tivesse sido ofuscado por um outro que ainda invisível se anunciava nos reinos da natureza. Os peregrinos e os habitantes de Jerusalém se surpreenderam quando Jesus pela manhã, montado no burrinho, passou por uma das portas da cidade. Essa semana também viria a ser uma espécie de portal para uma nova era da humanidade. Um júbilo se ergueu de entre os reinos da natureza das pedras, das plantas, dos animais e também da humanidade. Um brilho tênue se espalhou pela cidade, vindo do manso Jesus, do seu interior, de sua determinada intenção pelo mais elevado ato de amor. Era um rei que havia chegado? O reino divino do Eu Sou em Cristo queria se estabelecer na Terra, na alma humana, no coração humano.

No entanto, o drama dessa semana foi que quase ninguém conseguia imaginar o que era necessário para que isso acontecesse. O antigo sol iria escurecer, a terra tremer, o Filho do Homem iria ser traído, condenado à morte na cruz, seu coração iria ser perfurado e o seu sangue ia correr. Quem poderia aguentar ser testemunha desse acontecimento da morte do Filho de Deus na cruz? João, o evangelista, o Lázaro-João, o iniciado pelo Cristo, Maria, Maria Madalena e as outras mulheres e mais tarde Nicodemos e José de Arimateia, que iriam cumprir dignamente o ritual do sepultamento de Jesus. Mas, enfim, no último dia dessa semana, no Sábado de Aleluia, Jesus Cristo, em posse total da sua consciência, vai conseguir descer aos infernos, às camadas mais profundas da Terra para romper as cadeias que prendem a alma humana aos seres adversos, ao seres do mal. Desde então, o Sol de Cristo brilha no interior da Terra, a transformando. Desde então, o Sol de Cristo brilha nos corações daqueles que o seguem para a espiritualização da natureza humana mortal e transitória.

Todo ano, na Semana Santa, seja qual for a crise pessoal ou mundial, podemos ficar consolados porque o Pai enviou seu Filho para nos salvar. Por outro lado, NÓS podemos ativamente vivenciar a dimensão do seu sacrifício em nós mesmos, nos tornarmos verdadeiras testemunhas e, então, seus seguidores, para um dia sermos capazes de realizar o ato de amor, o sacrifício necessário para colaborar com a obra do Pai.

Helena Otterspeer

Reflexão para o domingo, 17 de março de 2024

Referente ao Evangelho de João 8:1-12 

Ao contemplarmos a imagem vibrante de um prado ensolarado, onde os raios quentes do sol caem em cascata sobre a terra, acendendo um caleidoscópio de cores e dando vida a cada folha de grama e pétala de flor, percebemos como o efeito da luz no florescimento da vida na Terra é palpável e profundo. Do delicado bater das asas das borboletas ao melodioso chilrear dos pássaros, cada criatura desempenha um papel vital na grande tapeçaria da existência, todas conectadas pelo poder vivificante da luz solar. Esse poder criador da luz é o mesmo que no prólogo de João aparece como o verbo divino a partir do qual tudo que existe foi feito. Na alma humana a luz se manifesta de outra forma: o correspondente à luz que nos permite ver as coisas do mundo físico, a luz na alma é o que nos permite conhecer, entender, tornar consciente. Esta luz radiante encontra sua corporificação nos ensinamentos de Jesus, que declara repetidamente: “Eu sou a luz do mundo. Quem me segue nunca andará nas trevas, mas terá a luz da vida”. Nestas palavras profundas, Jesus convida a humanidade a deleitar-se no brilho da verdade divina e a encontrar consolo na iluminação dos seus ensinamentos. Além disso, no Sermão da Montanha, Jesus estende esta imagem luminosa aos seus discípulos, proclamando: “Vós sois a luz do mundo”. Aqui, Jesus capacita seus seguidores a se tornarem portadores da luz divina, brilhando com compaixão, justiça e amor em um mundo envolto em trevas. O Cristo nos convida a abraçar o esplendor da verdade, a incorporar sua luz e a caminhar como faróis de esperança e iluminação num mundo que anseia pela verdade. Como dizia Thomas Merton en suas “Sementes de contemplação”: “ Cada momento e cada evento da vida de cada homem na terra planta algo em sua alma. Pois assim como o vento carrega milhares de coisas invisíveis e sementes aladas visíveis, assim o fluxo do tempo traz com ele germes de vitalidade espiritual que repousam imperceptivelmente nas mentes e vontades dos homens. A maior parte dessas inúmeras sementes perecem e se perdem, porque os homens não estão preparados para recebê-las: pois sementes como estas não podem surgir em nenhum lugar, exceto no bom solo de liberdade e desejo”. Essas sementes nesse solo da alma só poderão frutificar, se forem iluminadas pela luz divina, gerando sabedoria, discernimento, consciência e consequente ação transformadora no mundo. 

 Carlos Maranhão

Reflexão para o domingo, 10 de março

Marc Chagall – A Madona da aldeia (1938–1942)

Referente a perícope do Evangelho de João 8, 46-59

Segundo o prólogo de João, uma das mais elevadas faculdades humanas é ser testemunha da luz! A luz, essa qualidade contida na vida divina e na unidade primordial do logos, antes mesmo que o mundo existisse. Esse testemunho é o que capacita o ser humano a seguir os intuitos divinos para o bem! No entanto, com que sentido podemos vir a ser testemunha do divino? Não somos clarividentes… No passado pudemos contar com os grandes iniciados e os profetas, que puderam receber a revelação divina, ouvir a palavra divina e guiar os seus respectivos povos. Do passado nos alcança a glória de grandes iniciados como Zaratustra na época cultural persa, dos faraós egípcios como o famoso Aquináton, a glória de Abraão, Moisés e Elias no povo israelita. No entanto, a medida que a alma humana foi se individualizando e despertando os sentidos, sobretudo para a realidade física, a humanidade foi perdendo a possibilidade de pelos métodos de iniciação antigos ter experiências no mundo divino. As fontes de luz e vida das antigas iniciações foram se exaurindo. A pobreza espiritual da humanidade foi se alastrando e com isso as doenças e todos tipos de problemas.
A partir de então, não havia mais a autoridade espiritual para orientar os povos. O ser humano, afastado do mundo divino, fica encapsulado em si, fica sujeito ao egoísmo. As leis que regem os povos tentam preservar a sociedade dos abusos do egoísmo e da falta de orientação espiritual. Para tal se iniciam processos para julgar os indivíduos e nesses processos estão envolvidas as testemunhas. Ninguém podia então se apresentar em nenhuma situação como testemunha de si mesmo. Pelo menos duas testemunhas eram necessárias para assegurar a veracidade de um acontecimento ou a legitimação de uma autoridade.
Como representante de toda a humanidade, ninguém viveu tão profundamente a perda das fontes divinas para a renovação da vida como Jesus na sua juventude. Na suas andanças como carpinteiro pôde constatar como mesmo os lugares mais sagrados haviam sido entregues às forças demoníacas. Os povos se encontravam à mercê da atuação maligna dos seres adversos. De uma forma latente, Jesus aspirava intensamente uma reversão dessa calamidade!
Isto aconteceu por uma intervenção divina no batismo do Jordão! O espírito de Cristo desceu e se incarnou em Jesus. Esse é um novo modelo para uma nova iniciação válida para todo o futuro da humanidade! A alma humana se submete a iniciação pela incorporação do espírito de Cristo em si, o Eu Sou da humanidade. Agora o espírito de Cristo na alma vai ser testemunha da luz divina no mundo. Ele está habilitado a ser testemunha autêntica, legítima da atuação e metas divinas. O casamento da alma humana com o espírito de Cristo é o novo órgão do sentido para testemunhar a luz. O Eu Sou de Cristo realiza a vontade do Pai. O Eu Sou de Cristo é completamente isento de qualquer egoísmo e tudo que aspira é para o bem de todas as criaturas, mesmo para o bem de toda a Terra. Não há nenhum novo paradigma para solucionar os imensos problemas da atualidade senão aspirar esse casamento da alma humana com o espírito de Cristo. Esse casamento acontece dentro de si mesmo ou ele pode ser reconhecido em outros seres humanos. Esse casamento fundamenta a formação de comunidades espirituais, que se agregam a seres espirituais. Essa comunhão de almas humanas com seres divinos poderá continuar o processo de reversão da degeneração espiritual da Terra e da humanidade. É a reversão da degeneração para uma elevação, para uma ascensão e uma espiritualização!
Sejamos aqueles que se reúnem para festejar esse casamento, que já está acontecendo e evolvendo na alma humana. Esse festejar – que também celebramos nos sacramentos – vai restaurar as fontes de vida e luz perdidas para um futuro prometedor!

Helena Otterspeer