Conto: Tikeva – Parte 1

Tikeva havia nascido em Jerusalém. Seu pai era um escriba, um estudioso das leis, das regras e dos textos sagrados dos judeus. Por este motivo Tikeva, desde muito pequena, sempre havia ouvido muitas histórias que seu pai contava, as histórias do seu povo. Ela gostava muito de ouvir aquelas histórias.
Havia uma em especial que Tikeva gostava mais que as outras. Era a que seu pai contava sobre a vinda do Messias, transmitida pelos antigos profetas. O Messias se tornaria o rei. Um rei poderoso, que traria alegria e felicidade para todos, pois seria o próprio filho de Deus que viria à Terra. Tikeva não conseguia imaginar como isso poderia ocorrer. Ela desejava muito que quando essa profecia acontecesse ela pudesse vê-la.
A cidade de Jerusalém ficava no alto de uma colina chamada “Monte Sião”. Haviam construído uma grande muralha em volta da cidade. Descendo do Monte Sião se chegava ao Vale do Rio Cedro. Do outro lado do vale havia outra montanha, chamada “Monte das Oliveiras”. Por trás do Monte das Oliveiras se estendia um grande planalto que terminava no meio do deserto, o “Deserto da Judeia”.
Um dia, o pai de Tikeva subiu com ela até o muro da cidade. Lá de cima se podia observar do alto o que havia em volta. Foi uma vivência bem especial para a pequena Tikeva. Seu pai sentou a jovem menina em cima do muro, segurou-a bem e apontou para o lado do Monte das Oliveiras por trás do monte se via o grande planalto que se perdia no meio do deserto. Ele falou: “Está vendo Tikeva? Olhe, está começando a nascer a Sol”. A menina olhou para aquele lado, no oriente, e o sol estava começando a surgir no horizonte. A luz foi ficando intensa e bonita, e enquanto o Sol ia ascendendo o pai lhe dizia: “Os profetas disseram que um dia, desta direção, do lugar de onde nasce o Sol, caminhando por ali, vindo do deserto, virá o Messias. Ele descerá o Monte das Oliveiras e entrará na nossa cidade”. A história era bem curta, só dizia isso, mas Tikeva nunca esqueceu estas palavras

Passaram-se os anos…

Um dos passeios preferidos da menina era subir até a muralha da cidade, olhar para o oriente, onde o Sol nasce, e ficar ali esperando para ver as primeiras luzes do dia. Observando o nascer do Sol, ela pensava: “Quando virá o Messias?”. Depois de um tempo de silêncio, observando o nascer do Sol, Tikeva retornava à sua casa.
Sempre que lhe era possível, Tikeva subia até aquele lugar para olhar o nascer do Sol e pensar naquelas palavras.
Aconteceu em um domingo, Tikeva já não era mais uma criança, havia se tornando uma jovem. Como muitas vezes havia feito, subiu até a muralha da cidade de Jerusalém, antes da saída do Sol e ficou observando o oriente. Admirava como o céu ia ficando colorido, cada vez mais claro, até que viu as primeiras luzes do Sol surgindo no horizonte, no meio do deserto. A luz foi aumentando e se intensificando, ficou cada vez mais claro. O Sol já estava bem grande, iluminando toda a terra, quando Tikeva teve uma surpresa: caminhando nas primeiras luzes da manhã, vindo em direção a cidade, ela viu alguém montado em um jumentinho, a sua volta havia várias pessoas. Ela contou com atenção: eram doze homens que acompanhavam aquele que vinha montado no animal de carga.
Tikeva, em um primeiro momento, estranhou aquela imagem. “Por que somente um vinha montado em um jumentinho e os outros caminhavam?”. Não pareciam comerciantes ou vendedores pois estes se reuniam em caravanas muito maiores, cheias de dromedários e camelos carregados de fardos. Aquele era um grupo pequeno que caminhava sem bordão, sem alforjes, sem nada. Eles simplesmente caminhavam e acompanhavam aquele que vinha montado no jumentinho.
De repente Tikeva se admirou porque o Sol já estava mais alto no céu, mas, ainda assim, um intenso brilho acompanhava aquele grupo de homens. Olhando com atenção, ela percebeu que era justamente daquele que montava o jumentinho, que vinha uma luz quase tão forte como o Sol. Suas vestes brilhavam, parecia que refletiam ali, no meio do deserto, a luz do sol, irradiando todos os que o acompanhavam.
Eles se aproximavam cada vez mais e Tikeva os observava. À medida que o Sol subia, parecia que mais intenso ficava o brilho das vestes daquele que montava o jumentinho.
Naqueles dias, acampadas no vale do Rio Cedro haviam muitas pessoas pois naquela semana aconteceria uma festa muito importante na cidade, a festa chamada “Pessah”, a Páscoa dos judeus.
No instante em que o grupo de homens vindo do deserto chegou no topo do Monte das Oliveiras, as pessoas que estavam embaixo no vale olharam para o alto e perceberam que alguma coisa diferente estava acontecendo.
Alguns correram e cortaram ramos e galhos de palmeiras e outras plantas. Outros começaram a estender seus mantos pelo caminho. Aquele que vinha montado no jumentinho descia vagarosamente com seu animal a encosta do Monte das Oliveiras. Ao chegar lá embaixo, havia no vale um enorme tapete feito com os mantos e véus das pessoas, recobrindo o caminho que chegava até o grande portal que ficava no muro da cidade. Enquanto aquele que ia montado no jumentinho trotava por esse tapete, as pessoas ao lado abanavam os galhos e os ramos e gritavam:

“Viva! Viva!”

“Hosana ao filho de Davi!”

“É ele que vem em nome do Senhor!”

Gritavam tão forte, tão alto, que Tikeva do alto foi capaz de ouvir. Ela lembrou da história dos profetas que seu pai havia contado. “Seria aquele, o tão esperado Messias?”, pensou.
Com certeza, pois o brilho que ela havia visto ao longe enquanto caminhavam, continuava ali no vale. A luz do Sol ainda não havia dissipado as sombras na parte debaixo do vale, mas, mesmo assim, as suas vestes brilhavam como o Sol irradiando luz no meio de todas aquelas pessoas. Tikeva então teve certeza, “esse é o nosso tão esperado Messias”.
Ela foi correndo para casa, chamou seu pai e disse: “Pai, venha, vamos ver! A cidade toda está lá fora, todos estão saudando e gritando! Eu vi! Eu vi! Eu vi o Messias, como você me contou, ele veio do oriente, de onde nasce o Sol. Ele veio montado em um jumentinho, como disseram os profetas! Vamos vê-lo! Vamos! Ele está chegando à cidade!”.
O pai de Tikeva ficou um pouco confuso com o que sua filha dizia. Ele sabia que a cidade e o vale estavam cheios de pessoas que vieram para a festa e havia muito movimento, mas, mesmo assim, decidiu acompanhar a filha pelas ruas da cidade. Quando chegaram perto do grande portal no muro da cidade, viram que alguém estava ali: Um homem rude, com suas roupas bem humildes e simples, descendo de um jumentinho. A sua volta estavam seus companheiros que o ajudavam. Tikeva ficou surpresa ao olhar para ele, pois parecia um homem comum, seus companheiros também eram homens muito simples. Tikeva então perguntou ao pai: “Quem é esse homem, meu pai? Você o conhece?” “Esse homem”, disse o pai, “é o filho de um pobre carpinteiro, seu nome é Jesus. Seus companheiros são pescadores da Galileia, homens rudes de aldeias do interior. Ele não pode ser o Messias, Tikeva, você se confundiu”. A menina por um momento ficou confusa. Todo aquele brilho e aquela luz que ela havia visto, haviam desaparecido. Ali estava um homem simples, um homem comum. As pessoas a sua volta ainda estavam um pouco alegres e eufóricas, mas aquele homem estava sereno, conversando com os que estavam próximos. Disse então para um de seus companheiros, que levasse o jumentinho de volta ao lugar de onde o haviam tirado. Ele caminhou pelas ruas da cidade em direção ao templo.
Tikeva pensou: “Será que eu me confundi? Será que toda aquela luz e aquele brilho não tinham sido verdadeiros? Será que eu me enganei?”. Quando ela olhava para Jesus, ele parecia um homem tão simples. Ele não poderia ser o tão esperado Messias. Entretanto no fundo do seu coração, Tikeva sabia que não havia inventado tudo aquilo, que não havia sido ilusão. O que ela havia visto, ela sabia que era verdadeiro. Será que as pessoas também haviam percebido aquela luz? Tikeva perguntou para um e para outro, mas parece que ninguém, a não ser ela, havia tido aquela percepção. As pessoas o haviam visto descer o Monte das Oliveiras, montado num jumentinho como um homem comum. Eles o saudaram porque ele era especial, era um profeta, falava coisas boas e bonitas, ensinava as pessoas, curava os doentes. Mas no coração de Tikeva permanecia a pergunta: “Será que este Jesus é o nosso tão esperado Messias?”

(…)

Nota para os familiares:
Esta história continua no Domingo de Páscoa.
Tikeva significa “Esperança” em hebreu.

Renato Gomes