“Junto à cruz de Jesus, estavam de pé sua mãe e a irmã de sua mãe, Maria de Cléofas, e Maria Madalena. Jesus, ao ver sua mãe e, ao lado dela, o discípulo que ele amava, disse à mãe: ‘Mulher, eis o teu filho!’ Depois disse ao discípulo: ‘Eis a tua mãe!’ A partir daquela hora, o discípulo a acolheu no que era seu. Depois disso, sabendo Jesus que tudo estava consumado, e para que se cumprisse a Escritura até o fim, disse: ‘Tenho sede!’ Havia ali uma jarra cheia de vinagre. Amarraram num ramo de hissopo uma esponja embebida de vinagre e a levaram à sua boca. Ele tomou o vinagre e disse:
‘Está consumado’. E, inclinando a cabeça, entregou o espírito.
Era o dia de preparação do sábado, e este seria solene. Para que os corpos não ficassem na cruz no sábado, os judeus pediram a Pilatos que mandasse quebrar as pernas dos crucificados e os tirasse da cruz. Os soldados foram e quebraram as pernas, primeiro a um dos crucificados com ele e depois ao outro. Chegando a Jesus, viram que estava morto. Por isso, não lhe quebraram as pernas, mas um soldado golpeou-lhe o lado com uma lança, e imediatamente saiu sangue e água. (Aquele que viu dá testemunho, e o seu testemunho é verdadeiro; ele sabe que fala a verdade, para que vós, também, acrediteis.) Isto aconteceu para que se cumprisse a Escritura que diz: ‘Não quebrarão nenhum dos seus ossos’. E um outro texto da Escritura diz: ‘Olharão para aquele que traspassaram’.”
João 19, 25-37
As últimas palavras de Jesus Cristo na cruz foram: “está consumado”.
Quando nós celebramos o culto da Comunidade de Cristãos, as primeiras palavras que falamos são: “Consumemos dignamente o Ato de Consagração do Homem”.
Toda criação tem a sua origem no divino, assim como também nós, seres humanos. No princípio estávamos unidos com o divino, fato que encontramos na Bíblia, no relato sobre o paraíso. A natureza poderia ter permanecido nessa ligação. Mas não o ser humano, pois, para desenvolver a sua liberdade, foi necessário que ele se separasse do divino e deixasse o paraíso. Ao sair do paraíso levamos conosco toda a natureza. A natureza tem a sua origem em Deus, mas hoje, como a encontramos em nosso derredor, ela se apresenta como obra divina, como a consequência da criação que ocorreu no princípio. Hoje, a potência criadora divina não atua mais diretamente na natureza; a obra divina se repete nos processos naturais.
Mas a natureza não tem, em si, a possibilidade de voltar a se unir com a sua origem divina. Apenas nós, seres humanos, temos essa possibilidade de, em liberdade, nos unirmos com o divino. E, por termos levado a natureza, no caminho de separação da origem divina, temos a responsabilidade de levá-la conosco, no caminho de unirmo-nos novamente com o divino. Este processo de unir um ser à sua origem divina, seja nós mesmos ou um ser da natureza, é o que chamamos de consagração. Consagrar algo é possível por um culto religioso, seja a consagração de substâncias ou de uma igreja, e também a consagração de um sacerdote. Mas todos nós, quando celebramos o culto, almejamos unir a nossa existência terrestre com a realidade divina, consagrando assim o ser humano. Consagrar algo é possível pela arte, quando num processo realmente artístico, uma realidade espiritual pode manifestar-se numa expressão sensorial, consagrando o nosso dia a dia pela criatividade. Consagrar algo também é possível pelo conhecimento, quando procuramos reconhecer que o divino espiritual criou o mundo, nele atua como obra, mas vive como ideia que pode ser pensada por nós. Ideia que podemos unir com a percepção do mundo, no momento do processo espiritual do conhecimento. Consagramos o mundo unindo, em nossa consciência, a percepção com a ideia. Religar o homem e a natureza com sua origem divina, seja pela religião, pela arte ou pela ciência, tornou-se possível porque o Cristo consumou essa religação pela sua vida e morte na Terra. Um ser divino se une conosco e consuma a possibilidade de nós, em liberdade, nos unirmos a Ele. Aquilo que falamos no início de nosso culto é, na realidade, a meta para a nossa vida, em qualquer momento, em qualquer lugar. Que o nosso esforço seja realmente dedicado a consumar o ato de consagração do homem.
João F. Torunsky