Conto de Pentecostes (Parte 2)
No dia da Ascensão de Jesus, Stéphanos foi convidado pelo discípulo João a participar do encontro com os outros discípulos. Ele contou a todos os que estavam reunidos na casa o que havia visto e o significado da mensagem das nuvens que havia interpretado. Os discípulos ficaram contentes com a notícia, pois agora conseguiam imaginar que Jesus simplesmente não havia partido, mas que ele estava se expandindo com as nuvens, para poder levar sua mensagem a todos os lugares. Restava, entretanto, a questão: Jesus lhes pedira que permanecessem um tempo na cidade e que lhes enviaria um sinal. Que sinal? Quando lhes enviaria? Quanto tempo teriam que esperar?
A partir daquele dia, Stéphanos passou a frequentar aquela casa, que servia de lugar de reunião para os discípulos; participava com eles da refeição e ouvia com muita atenção todas as histórias que eles contavam sobre o que haviam vivido e aprendido com o mestre. Mesmo sem ter conhecido Jesus pessoalmente, Stéphanos começou a sentir que se familiarizava cada vez mais com ele, tão vívidas eram as narrações daqueles que o conheceram e conviveram com ele!
Todas as manhãs o jovem Stéphanos ia ao templo, como seu tio Jacob lhe havia orientado, mas sempre lhe sobrava um pouco de tempo para ir à casa dos discípulos escutar mais histórias. Depois retornava à casa do tio, para ajudar nos trabalhos e tarefas que fossem necessários, no final da tarde subia à torre para observar o céu. Stéphanos andava intrigado, pois, desde o dia da ascensão, o céu estava sempre azul e límpido, totalmente sem nuvens. Ele observava toda volta do horizonte e não conseguia ver o menor sinal de nuvens no céu. Até mesmo o ar parecia imóvel, raramente soprava vento ou brisa
Stéphanos nunca havia vivenciado algo assim na ilha de Syme, onde nascera!
Passaram-se assim dez dias, no total haviam se completado os cinquenta dias desde que Jesus havia ressuscitado. Era novamente um domingo. O jovem estava no templo. Havia muitas pessoas por lá pois naquele dia se celebrava uma festa importante no Templo. Muitas pessoas tinham vindo de lugares distantes de Israel. Stéphanos ouvia pessoas falarem em diversas línguas, cada uma usava o idioma do país de origem. Hebraico, grego, latim, árabe, fenício, cretense, egípcio, persa e muitas outras línguas eram ouvidas nas conversas dos pequenos grupos de pessoas que circulavam pelo pátio do templo. Era comum que acontecessem alguns desentendimentos ou dificuldades de comunicação pois quando uma pessoa falava ou pedia algo em seu idioma, havia outros que não a entendiam ou a compreendiam equivocadamente, gerando assim discussões.
Stéphanos lembrou de uma história que havia ouvido na infância: Há muito tempo todos os seres humanos falavam a mesma língua. Um dia desejaram construir na cidade de Babel uma torre que alcançasse o céu, mas se desentenderam e não conseguiram terminar a obra. A partir daquele momento, por causa dos desentendimentos, as pessoas começaram a falar de maneira diferente uns dos outros e deixou de haver comunicação entre eles. A partir daí surgiram as diferentes línguas. Os grupos de pessoas, que se entendiam, se separaram formando os diferentes povos e países com seus diferentes idiomas.
Stéphanos pensou que seria bom se todos pudessem se entender como havia sido no início! Naquele dia, no pátio do templo, havia inúmeras pessoas que tinham vindo a Jerusalém para celebrar a mesma festa, todos estavam ali pelo mesmo motivo, mas ainda assim não conseguiam se entender bem umas com as outras. Tão diferente era a linguagem das nuvens: elas aparecem no céu em qualquer lugar, vão livremente em todas as direções e quem aprende a prestar atenção a elas, começa a compreender sua mensagem, independente da sua língua de origem. Stéphanos, porém, já havia notado que a maioria das pessoas não se interessava muito em olhar para o céu e observar as nuvens!
Com estes pensamentos, o jovem procurou um canto mais sossegado no pátio do templo, um lugar mais afastado da balbúrdia geral. Começou então a olhar o céu azul e límpido que permanecia sem nuvens. Foi neste instante que Stéphanos percebeu que havia uma brisa suave passando. Quieto e atento ele esperou. Pouco a pouco percebeu que junto com a brisa vinha um ruído, um som bem suave. Stéphanos logo entendeu que este som queria transmitir algo. Tentou identificar de onde vinha a brisa e para onde ia. O jovem, então, começou a caminhar na direção para onde aquele suave vento soprava. Cruzou todo o pátio do templo passando entre as pessoas. Foi difícil ficar atento ao som da brisa no meio de tantas vozes e gritos, mas a habilidade de bom e atento observador do jovem o ajudou. Saiu do templo e começou a caminhar pelas estreitas ruas da cidade de Jerusalém. À medida que avançava, o som ficava mais audível. Levado pela voz da brisa, Stéphanos chegou à casa onde os discípulos costumavam se reunir. Bateu à porta e um dos serventes abriu-lhe e comentou com um sorriso:
— É bom que você tenha chegado mais cedo! Todos os discípulos já estão reunidos no andar de cima, pode ir até lá encontrar-se com eles e com todos que vieram!
Enquanto Stéphanos subia a escada que conduzia ao andar superior, percebeu com admiração que a brisa continuava a soprar no interior da casa e o som ficava mais forte à medida que se aproximava da sala onde os discípulos se encontravam. Os discípulos estavam reunidos, formando um círculo. Simão Pedro havia acabado de fazer um sorteio para escolher quem poderia ocupar o lugar de Judas Iscariotes, que já não pertencia ao grupo. A sorte havia indicado um jovem de nome Matias, que veio se sentar juntos aos demais no círculo, completando assim o número de doze, como eram nos dias em que todos eles caminhavam com Jesus pelas aldeias e cidade de Israel. Todos começaram a rezar em silêncio. Stéphanos percebeu que o som da brisa foi se tornando cada vez mais intenso. Parecia que um forte vento soprava dentro da casa até que apareceu no alto uma grande chama que logo se repartiu em doze chamas menores e cada uma delas veio a repousar sobre a cabeça de um dos discípulos sentados no círculo. Todos os presentes presenciaram com admiração o que havia acontecido. Neste instante, Simão Pedro se levantou e tomou a palavra: — Irmãos, este foi o sinal que nosso mestre Jesus havia prometido e que agora nos enviou: É chegado o momento de sair e contar a todos as maravilhas que Jesus Cristo nos ensinou! Vamos! Saiamos!
Todos saíram da casa e se dirigiram ao templo. Lá começaram a falar e, para surpresa de todos, eles falavam de tal modo que cada um dos que estavam no templo os entendiam em sua própria linguagem, não importando de que país tinham vindo. As discussões e os desentendimentos cessaram por um instante e muitos se aproximaram aos discípulos paro ouvir o que diziam, ficando assim maravilhados. Stéphanos lembrou-se da história da Torre de Babel que gerou a confusão das línguas e pensou: “Parece que o fogo divino que se repartiu entre os discípulos, trouxe a possibilidade de superar o desentendimento e que será possível que nos comuniquemos de novo uns com os outros de forma plena!”
Olhando para o céu o jovem viu que várias pequenas nuvens vindas de todos os lados se aproximavam e pairavam no céu bem acima do pátio do templo. “Que bom que as nuvens voltaram!” – alegrou-se Stéphanos! As nuvens formavam no céu um mosaico harmonioso e bonito de se ver, em consonância com a harmonia que acontecia na Terra.
Houve, entretanto, algumas poucas pessoas que se incomodaram e começaram a reclamar: — O que estes simples pescadores da Galileia estão fazendo aqui? Eles não são homens cultos! Como podem estar falando estas coisas sobre o Reino de Deus? Como é possível que todos os compreendam em suas próprias línguas? – se perguntavam. Outros ainda, retrucavam: — Talvez tenham bebido muito vinho! Por isto estão tão exaltados!
Stéphanos, porém, sabia que o motivo era outro!
Muitas pessoas participaram naquele dia deste grande milagre, que mais tarde ficou conhecido como a festa de Pentecostes, a festa do quinquagésimo dia após a ressurreição de Jesus Cristo. O dia em que Ele enviou o fogo do espírito aos discípulos para anunciar a todos os povos e em todas as línguas a boa mensagem que traz paz e alegria ao coração das pessoas!
Renato Gomes